segunda-feira, 9 de setembro de 2024
Era, tal como eu o sempre o perspetivei, uma instituição original, sem paralelo na nossa República, sempre tão excessivamente centralizadora e “soberanista” face a uma sociedade civil frágil e dependente. E era, por isso mesmo, uma nova maneira de governar, em diálogo, em parcerias sem fim, com organizações fortes e independentes do Estado, como são as das Comunidades Portuguesas, que ao Estado nada devem, antes pelo contrário. De facto, ao longo de séculos, no aspeto da Cultura, como no da assistência social, substituíram-se a Governos distantes e à ausência de políticas públicas.
Nada me deu mais gozo na vida política do que engendrar essa plataforma que se chamou Conselho, onde o Governo, que eu representava interagia com uma assembleia de representantes das comunidades, de igual para igual. Uma távola redonda! O CCP foi a minha távola redonda e o não haver mulheres entre eles, foi, “hélas”, o preço a pagar pela não interferência no processo de escolhas (houve que esperar o momento certo para a abertura às questões de género, que surgiu com a presença de uma primeira mulher, e uma “mulher de armas”, a jornalista Maria Alice Ribeiro de Toronto)
Creio ter, assim, dado um contributo para instituir espécie de Órgão corporativo, nas antípodas do corporativismo do Estado (o do Estado Novo), pondo o acento tónico no muito admirável mundo organizacional das comunidades portuguesas, não no Terreiro do Paço. Ou seja, num espaço de voluntariado social, beneficente, cívico e cultural.
A ideia da criação do Conselho não foi minha, foi de estrategas da AD, expressa, com destaque, como promessa capital, no programa eleitoral. Todavia, pelo acaso de estar naquele cargo, naquele preciso momento, caiu-me nas mãos para executar, sem livro de instruções. Ou melhor, apenas com uma diretriz clara, a impor respeito pela total autonomia dos interlocutores civilistas. Segui-a à risca e rapidamente, elaborando uma lei flexível, aberta a consulta “ex post”. Foi avançada sem parecer prévio, justamente para apressar a convocatória e reunião do Órgão, ainda em 1980. Intuito baldado pelo conflito aberto entre Belém e São Bento, (ou entre Belém e a Gomes Teixeira), que levou à retenção do diploma durante cinco meses (como chamado “veto de bolso”), atrasando por um ano o arranque do CCP. Há males com os seus aspetos positivos, e foi o caso, na medida em que me deu tempo para contactar comunidades dos quatro cantos da terra, de observar as suas caraterísticas, formas de atuar, virtualidades, problemas, carências. Sempre com uma perspetiva hibridista, entre a estudiosa e a trabalhadora social - e daí um perspicaz compatriota do Québec me ter descrito, na tal carta dirigida ao Provedor de Justiça, como “uma missionária que passou por aqui”. (não se imagina quanto fui objeto de “gozação” pelos meus colegas da Provedoria, sendo a única resposta rir-me com eles).
A verdade é que eu não correspondia ao estereótipo do governante, nem na indumentária, nem no discurso. Eu tentava, esforçava-me, mas ficava sempre aquém da meta. Nos hotéis, olhavam para mim e para as senhoras ou senhores da comitiva, davam-lhes o quarto grande e a mim o quarto pequeno. Foi assim que um assessor, o Dr Victor Gil, passou uns dias numa faustosa “suite do Copacabana Palace, no Rio, e à Presidente do Instituto, Maria Luísa Pinto, isso aconteceu frequentemente. Às vezes, ocasionalmente, descobríamos o engano, (se eu comentasse, por exemplo, que o hotel era bom, mas o quarto um bocadinho acanhado). Dando conta do equívoco, a Maria Luísa queria logo fazer a troca, que eu rejeitava, é claro. Um trabalhão escusado, porque o tempo para “curtir” as facilidades extra era escasso. Ela andava sempre muito mais chique do que eu – era o seu natural, como o meu é ter tendência para uns fatinhos sem grande cor nem graça. Mas um dia aparecemos no Instituto igualmente trajadas – igualmente, mesmo, com vestidinhos comprados numa loja de Waterbury, onde o nosso Cônsul nos levava num intervalo da digressão.
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