quarta-feira, 25 de março de 2009

W74 - MARIA EDUARDA AGUIAR DA FONSECA - "DOCAS"

Maria Eduarda nasceu a 25 de Março de 1945, em Paços de Ferreira.
Foi uma menina graciosa, alegre, brincalhona, feliz.
Assim comecou , bem, o que a Lélé - no video que lhe dedicou, a 25 de Março de 2008 - chama UMA BELA VIDA! Não sei se ela concorda, inteiramente, com o titulo. Estas apreciacões genéricas, são muito subjectivas, como é evidente. Mas é assim que nós vemos o seu itinerário original - e ainda mais agora, depois que recomeçou a vida, aos 60, com novas e fascinantes actividades.
Voltando ao principio: Em criancinha, era muito morena, redondinha e meiga, olhos enormes e sorridentes, cabelo muito preto e liso, enfeitado, permanentemente, com enormes laços coloridos, que a ela lhe serviam, em primeira linha, para manusear a seda sedosa, com a mão esquerda, enquanto chupava (à falta de chupeta...) em dois dedos da mão direita - um tique de nascença, que quase a deixava com esses dois dedos mais magros do que os outros...
Uma imagem engraçada, castiça, diferente ... Uma beleza infantil, inegavelmente. E já uma pequena pessoa , com personalidade, brandamente, embora... Cheia de fãs. Os meus pais adoravam a Doquinhas, que parecia uma boneca. Nós também. Communis opinio...
Aos 6 ou 7 anos, tornou-se magrinha e ágil, com uma capacidade de arrancar, nas corridas, à frente de todos, incluindo o Nestó - e de os bater, aos mais velhos, sobre a linha da meta. Grande nadadora, também, discípula do pai, o Tio Eduardo, que, nas águas do rio Tua, como nas do Atlântico, parecia um "ser marinho", tal a cumplicidade com que mergulhava ou rompia as vagas altas do oceano, nas marés vivas de Agosto, em Espinho.
Já adolescente, em Setúbal, destacou-se no volei, e acho que até ganhou campeonatos escolares. Como veremos, alterna, assim, desde sempre, periodos de pura contemplação, nome elegante de preguiça, com outros de feérica actividade...
As irmãs Maria Antónia e Glória Doroteia (ou Mariazinha e Lola) eram inseparáveis, como se de gémeas se tratasse, e continuaram especialmente próximas depois de casadas, e isso muito permitiu estreitar os laços de relacionamento entre os seus 5 filhos. Para nós, a Lecas e eu, os três "Aguiar da Fonseca" foram sempre a quinta essência da amizade... e um passaporte para viagens ao interior de Portugal, em férias de sonho. A Docas e os manos tiveram, de facto, a sorte de conhecer o Portugal profundo, de norte a sul, porque o Pai, engenheiro de minas, aceitou empregos variados, em terras diferentes - minas de ouro, em Trás-os-Montes, ou de urânio, nas Beiras, ou de outra coisa qualquer, no Alentejo... O trio cresceu a vontade, em aldeias bonitas, em contacto com a natureza e com pessoas simples, sem nunca se sentirem superiores ou especiais. São gente boa!
E com uns Pais fantásticos, sempre prontos a apoia-los, nas suas passeatas pelos montes, a pé, a cavalo, de burro, ou de jeep... Bons alunos, bem dispostos, saudáveis - uma bela vida, desde essa era "pré-histórica". Para mim e para a Lecas, eles eram mais irmãos do que primos. As férias passadas com eles foram momentos únicos da nossa infância. Gostariamos de ter uns pais assim... Quem não gostaria?
A Docas tinha, desde pequenina, uma qualidade raríssima nessa idade : sentido de humor. Sinal seguro de inteligência cintilante, demonstrada a espaços...
Ninguém estúpido sabe, sequer, o que e ter espírito... No caso dela, discreto, porque era, e é, discreta e descontraída por natureza. De uma simplicidade franciscana , a vestir, e não só. Não quer nada de supérfluo - um exemplo nesta louca sociedade de consumo, em que estamos mergulhados, sem sabermos a extensão e grau dos nossos vícios... Afilhada do mítico Tio Zé da América, pode ser assim por efeito por influência padrinho (as "bençãos", diz o povo). Ou por influência do Pai, que também se bastava com pouco, muito pragmaticamente!
Por exemplo: a Docas recusa ter mais do que um anel, ou um relógio, ou uma carteira, ou um par de sapatos de verão e outro de inverno (exagero, mas não muito...). Se a deixassem, andava sempre com as mesmas calças velhas, e uma ou duas camisolas.
Uma vez, foi passar um mês a Genebra, quando eu lá frequentava um curso da OIT. Imaginem o meu espanto, quando vou espera-la ao aeroporto, ela sai, sem mala de cabine e , quando a quero dirigir ao "carroussel" das bagagens para a ajudar ao transporte (bons tempos, em que podíamos circular no interior dos aeroportos...) segue em frente: "Vamos embora. Eu não trago mais nada comigo". Isto é, trazia os documentos, a pasta de dentes, e pouco mais, num pequeno saco , multiusos, levada a tiracolo! Para mim, que não sou propriamente uma adepta da moda e do excesso, foi um choque!
Poteriormente, com a vida social intensa, que fazíamos naquele curso, ela teve de ir comprar umas coisas, nas lojas da cidade, então não tão caras como hoje... Comprou o mínimo, mas andou sempre chiquérrima e fez furor! Os meus colegas no "Study Course" eram todos homens ... Mulheres, só mesmo nós as duas - e já na parte final, umas "esposas", que não se misturavam com o grupo! A Docas, sem ser participante directa, foi positivamente adoptada. Estão a ver o assédio constante, embora amável, de que foi alvo e de qual se livrou sempre, com toda a diplomacia...
Outro momento social alto, muitos anos antes, na Freixêda, foi a sua comunhão solene, quando, apesar de não ser dada "ao palco", se saiu muito bem, dizendo uns versinhos, compostos pelo meu Pai, seu particular admirador. Muito bonita, com um vestido comprido, de organdi branco, sem tropeçar.
O Nestó também discursou e a Xana foi "fardada" de anjinho gordo, com asas . Ao lado, a Manica era o anjinho magro.
Em breve, a Docas teria de trocar os arejados montes pela cidade. Acabada a primária, estudou no Porto, depois em Setúbal. Fez o antigo 5º ano da Escola Comercial, por decisão, um pouco bizarra dos pais. Não se percebe a razão de não ter seguido o liceu: tinha de viver longe das minas, qualquer que fosse a opção...
Morou, depois, em Lisboa, Luanda, Genebra, Paris (para além de todas as vilas e lugares de "charme", de que já falei). Viajou pelo Sul de Africa, pelas Américas, Brasil, EUA, pelo Hawai, e por muitos países da Europa, naturalmente. Algumas dessa excursões, na minha companhia. Genebra, em 1968, era, para ela, a terceira estada no estrangeiro. Em 63, tínhamos excursionado durante um mês na região de Reno, parte do tempo em casa da minha "pen-pal" Gesinne Fast. Em 1967-68 viveu em Londres, como "au pair".
Outras saídas para fora se foram sucedendo, incluindo no período em que ela integrou - vejam só!... - e muito competentemente, como era de esperar, o meu gabinete, no Palácio das Necessidades (nesse caso, com a designação de "missões", é claro e com o dever de fazer um esforço suplementar no que respeita a indumentária. Organizou exposições, pelo mundo fora, partilhando responsabilidades com a Margarida de Castro Serra e Moura e com o muito célebre Jorginho (depois diremos porquê "célebre"...), desenhou uma artística e sóbria medalha de bronze, colaborou em publicações de diapositivos, em parceria com o Fernando Calado Correia (que deve ser mencionado, depois, numa outra veste, mais importante) e foi autora de muitos outros feitos fora do comum. Fez amigos no coração da nossa diplomacia... Estava requisitada à monotonia da Caixa de Previdência das Doenças Profissionais, atravésda qual tinha vínculo à função pública. Creio que a pausa na rotina valeu a pena.
Daí, acabou, quando aquele governo acabou, por ir para Genebra, juntamente com a colega Sarolta. Ambas para os servicos consulares. Se tivesse continuado estaria agora com uma reforma milionária. Mas as saudades do Fernando troxeram-na de volta a Lisboa e à Caixa de Previdência... Faltou-lhe a vocação para emigrante.
A Suiça não é a África... e do que a Docas tinha gostado mesmo era de Angola, de Luanda e das minas perdidas no mato, onde o Tio Eduardo passou uns anos -e ela o visitava, de vez em quando, mantendo residência na capital. Em Luanda, conheceu o "homem da sua vida": o Fernando Calado Correia, cirurgião, professor da Universidade, um encanto de pessoa, e um talentoso fotógrafo. Com, pelo menos, um belo livro publicado, em que a Docas colaborou. E as fotos em que a retratou dariam outro livro de arte.
Nos anos 80, quando a Docas, no MNE ou fora do MNE, aparecia com novo fato, que lhe ficava muito bem, eu dizia: "Foi o Fernando que escolheu!" . Acertava, invariavelmente...
Durante uns anos, morou comigo e com a Maria (e a Endora), na andar da Av. do Uruguai, onde ainda hoje o quarto onde ficava é "o quarto da Docas".
Até que decidiu ir viver com o Fernando - sem oficializar o casamento. A primeira da nossa geração a demonstrar esta mentalidade moderna. Para a época, uma ousadia! Agora, coisa banal... Ainda hoje a relação destes dois "solteiros" no registo civil permanece, indestrutível, enquanto à volta vão ruindo os casamentos tradicionais. E, nova originalidade, cada qual mora na sua casa: ela na Ajuda, ele no Restelo, ali bem perto.
O Fernando, é, tal como eu, um grande entusiasta e apoiante moral da nova vocação artística da Docas. Compra-lhe paletas, telas e tintas, e dá valiosas opiniões sobre as obras em feitura, algumas inspiradas em fotografias suas. E arremata, antes de virem a mercado, os mais espectaculares quadros da pintora. A nova exposição promete, mas mais de metade dos quadros ja serão de colecções particulares, quando o público tiver acesso ao acervo ...
Por esta pequena amostra, digam lá: a Docas teve e tem, ou não, uma "bela vida"?
Tal como como a Lélé, eu respondo afirmativamente E o que mais desejo é que assim continue, por muitos, muitos anos!



































Parabéns à nossa mais recente revelação do Circulo Aguiar

46 comentários:

Maria Manuela Aguiar disse...

Uma das primeiras histórias inesquecíveis da Docas, passadas na casa da Avó Maria, tem como outra protagonista uma prima da mesma idade, mas de temperamento vulcãnico, a Inês Maria.
Estava a Docas na companhia dos meus Pais, "posta em sossego", como diria o Poeta de uma outra Inês, quando é anunciada a chegada da família do Tio Tónio, com a filha, a Inês deste episódio.
Reacção da Docas, muito alarmada:
"Ai, meu Deus, que ela mata-me!".
Ipsis verbis! Tinha dois ou três anos. Os Tios registaram a tirada, depois de muito rirem.

Maria Manuela Aguiar disse...

Aos 6 ou 7 anos, outro acontecimento dramático, na Vila Maria:
Durante a representação de uma peça de teatro, provavelmente escrita pela dramaturga Manuela Aguiar, com ampla e entusiástica assistência familiar, alguém se esquece da "deixa" que a actriz Docas esperava para entrar em cena...
Lá dentro, improvisa-se e ela não chega a dizer a sua parte...
Oh, que desgosto!
Oh, quantas lágrimas!
E não foi de propósito, porque a Docas não era, nunca, objecto de partidas deste género. Era muito estimada e popular!

Maria Manuela Aguiar disse...

Dois ou três anos dpois,chegou o tempo de fumarmos às escondidas. Graças a Deus, na altura não havia droga - excepto o tabaco, claro.
Íamos, à vez,a Lecas, ela e eu, comprar "Definitivos" a uma mercearia próxima. E a Docas,quando tinha mesmo de ir, muito comprometida, dava imensas explicações ao merceeiro: "Os cigarros são para os meus Tios".
Como se alguém, em S. Cosme de Gondomar, acreditasse que os Tios da família Aguiar fumassem aquela miséria de cigarros ordinários...
Mas recusa de venda, nunca houve. Nem denúncia à Avó Maria.

Maria Manuela Aguiar disse...

Mais dois ou três anos, e ali, no mirante do fundo da propriedade, congeminámos e assinámos o documento conhecido como "O trio das tias".
Compromisso de nunca nos submetermos ao acto do casamento, à subordinação ou obediência oficial a qualquer homem. E quem rompesse o pacto, pagaria às outras uma multa milionária.
Das 3, a única a quebrar o compromisso, por acaso, fui eu mesma. Quem diria?
De qualquer forma, sem subordinação, nem obediência de espécie alguma...
Manteve-se. pois, em boa verdade, o "espírito" do Pacto!

Maria Manuela Aguiar disse...

Nas minas, de norte a sul de Portugal, as recordações são todas boas, mas tantas, que é difícil saber por onde começar...
As horas e horas de natação no rio Tua, por altura da comunhão solene da Docas e do Nestó.
Foi a família em peso!
Formaram um coro, que ensaiou, longamente na sala de visitas da Avó, com a tia Lina ao piano. A minha irmá era a solista, mas eu fui excluída porque, como a Docas, desafino demais...
Na Freixêda a logística da cerimó
nia foi complicada, mas resultou. O orgão veio de longe. O Padre, também. Era a 1ª vez que a capela ou igreja se utilizava para esse fim.
Foi um sucesso, com um cortejo de meninos mal ataviados, mas felicíssimos e uma multidão de fiéis, vindos, acho eu, dos arredores, porque a aldeia era pequena. Deve ter constado!...
Nestó e Docas, trajados pelo último figurino. Ambos discursaram, com pompa e serenidade, sem "lapsus linguae".
O coro deslumbrou, com vozes fabulosas, como as do Tio Serafim, da Madalena, do Tónio, dos meus Pais, entre outras. Afinadíssimos!
Seguidamente a tia Lola ofereceu um grande almoço, ao ar livre, para todo o Povo.
Madalena

Maria Manuela Aguiar disse...

Nessas férias, ficámos por lá, mais uma semana. Entre outras alegres brincadeiras. recordo a escalada dos palheiros, que havia nas traseiras da casa dos tios. Que sensação! E a Docas, muito magrinha, era dos mais expeditos.
Tinha o seu ar cândido e seráfico - que ainda não perdeu, de todo... - mas muita e inesperada "genica" à mistura.
Agora, a genica irrompe, mas de longe a longe, e só para certas tarefas, que empreende, como e quando quer.

Maria Manuela Aguiar disse...

Em outras minas, as da Bica, demos passeios saudáveis por montes e vales, dias inteiros - ela, o Nestó e eu. A Xana cansava-se, só ia para aventuras mais curtas.
Levavamos farnel, preparado pela Tia Lola. Uma vez, estava muito calor, e nós sentados, a comer o lanche, nas margens de um bonito regato. Havia laranjas, mas quentes, da exposição ao sol. A Docas pensou a melhor maneira de as refrescar. Descascou-as e, depois,foi colocá-las dentro de água, numa pocinha muito adequada, por onde a água corria, sem as arrastar.
Quando as fomos buscar, as laranjas estavam frias, e com bom aspecto geral. Porém quando comemos o 1º gomo, constatamos que só sabia a água do regato . o sabor da laranja fora-se, completamente, na força da corrente.

Maria Manuela Aguiar disse...

Já não sei em que ano da primeira meia década de 80 -talvez 1984 - a Docas, que, então estava a trabalhar comigo no MNE, acompanhou-me ao Brasil e estivemos em São Salvador da Bahía.
Era Cônsul de Portugal o Dr. Malheiro Dias. Muito simpático e bem disposto, um "cicerone" perfeito, que conjugou o programa oficial, com a visita a inúmeros museus e igrejas barrocas.
A mulher, Mª Helena, era brasileira e, num desses museus, apresentou-nos a um Carmelita encantador, que sempre me pareceu visionário e santo - e que, segundo ela possuia dotes adivinhatórios.
Todas - todos - passamos a acreditar nisso, depois do que nos disse sobre cada uma, ou cada um, de nós.
Não nos conhecia, mas vía-nos como se tivesse acompanhado as nossas vidas, desde sempre.
Eis o retrato que traçou da Docas (e que eu reproduzo com base em apontamentos da época!):

Muito talento não utilizado.
É muito preguiçosa - as coisas não lhe interessam... Só faz o que quer.
Mas é rigorosa, tipo cão de fila: quando promete, cumpre!
Temperamento irascível - de cabeça perdida, sai tudo, ou, então, fica doente.
Feitio buliçoso: depois de errar, não se humilha.
Temperamento quente e seco. Verdadeira. Nada esconde.
Irada, é fogo. Éter químico. Muito difícil ser dominada.
Quando se entusiasma é outra: rigorosa, arranca, transmite.
Muita inteligência. Seria um génio, se tivesse estudado!
Talento para a pintura, a escultura.
Incrível, não é?
Longe estava ela de tomar em mãos os pinceis - o que só faria 25 anos depois.
Com o talento que ele anteviu.
E, quanto ao resto, a meu ver, 100% certo...

Maria Manuela Aguiar disse...

Depois, o Frei ainada acrescentou que não devia guiar de noite, sem óculos e que devia usar sempre a luz de lado, não de frente.
Quanto à relação com o Fernando, ela carneiro, ele sagitário mencionou que são "fogo contra fogo" - por vezes desentendem-se, pela impossibilidade de ela fazer as coisas como ele quer. Ou de compreender a sua perspectiva.
Mas, fundamentalmente. tudo bem entre ambos, não é?

Maria Manuela Aguiar disse...

Mal comparando, como diz o povo, o querido frei da Bahia com uma curandeira do Chiado, estou a lembrar-me de uma história passada com a Docas, numa outra
consulta exótica.
Foi a Ana, minha secretária no gabinete da Sec. Estado da Emigração, que achava muita graça a estas coisas "transcendentais", quem nos entusiasmou a visitar a tal senhora. Para mim, era como ir "ler a sina". Nos meus tempos de criança eram ciganas velhas, vestidas de preto, de saias até aos pés que nos pegavam na mão e previam um futuro risonho, com maridos bonitos e um rancho de filhos. E uma vida longa... Tudo bom

Tanto a Docas como eu fomos à tal "médica espírita" com a Ana, por isso não assitimos ao que se passou com a outra. Mas eu lembro-me do relato, que, visto à luz do que me disse a mim é, no mínimo curioso...
Para começar, eu não sabia que ela tratava as doenças do corpo. Julgava que "deitava cartas", pura e simplesmente. Fiquei sem fala quando ela, de bata branca vestida, gordíssima, me perguntou qual era o meu problema de saúde. Não consegui inventar nenhuma, assim de repente.
Decidiu, então, olhando-me como a diletante que era, dar-me uma lição sobre reencarnação.
Neste capítulo, a Docas, com melhor memória do que eu, informa que ela se considerava a reencarnação de um médico famoso. E, pois, em matéria de reencarnações, que a memória desta personagem se centra e concentra.
As nossas próprias reencarnações.
No meu caso, via uma linha infindável de militares... de alta patente.
Quanto à Docas, só vislumbrava uma reencarnação muito, muito antiga... Um velhinho, pescador, que vivia numa ilha quase deserta. Apanhava o seu peixinho para sobreviver e passava o tempo a olhar o mar, em atitude plácida e comtemplativa. E, como a ilha era muito fria e húmida, sofria de reumatismo.
E, assim, diagnosticava à Docas, para além do gosto da vida simples, calma e comtemplativa, a tendência para dores reumáticas.
E não é que acertou? Nisso, e no perfil psicológico da "paciente" Docas.
De mim só direi que me dou particularmente bem com militares!
Há quem ache que tenho a mania de comandar. Verdade é que me dou particularmente bem com militares -de alta patente.
Não posso dizer que acredito nestas coisas.
Mas, il y a du vrai...

Maria Manuela Aguiar disse...

A tal vidente não ficou muito impressionada comigo, mas com a Docas, sim!
Até a convidou a assistir a uma sessão de espiritismo, convite que ela declinou.
Hoje está bem arrependida de ter perdido essa experiência. O seu lado místico!...
Certo é que foi reconhecida como alguém que tem "poderes".
Uma possível discípula...
Mais tarde, nas suas férias em Salvador - não quando foi comigo! -visitou um dos terreiros de comdomblé - com guia, claro...
Amanhã, ela conta. Hoje está com preguiça. Já trabalhou muito. Levou a sinistrada Olívia á farmácia, fez o jantar...
Até a Olívia gabou a sopa!

Maria Manuela Aguiar disse...

Nada de ficar com a idéia de que a Docas apenas se assemelha à sua velha reencarnação de pescador comtemplativo....
Desde que se reformou, para além das actividades artísticas, tem sido uma verdadeira Florence Nightingale para todos os necessitados do seu círculo.
Histórias edificantes que vão ser contadas.
A primeira beneficiária fui eu. Chamava-lha a "ajudante da céguinha".
O tenebroso período do meu descolamento da retina e as 3 operações sucessivas na Oflalconde...

Maria Manuela Aguiar disse...

A Docas, mal se reformou, veio passar férias em Espinho. Chegou numa 2ª feira , salvo erro 12 de Setembro de 2006, exactamente o dia em que eu, perseguida, desde o início do fim-de-semana, por uma mancha fixa no olho direito, regressava do Dr. Carlos Pereira, com a tenebrosa notícia de que teria de ser operada de urgência!
À espera do regresso ao país do Dr. Conde, fiquei 2 dias imóvel, na cama...
A Docas começou aí o seu tirocínio de enfermeira voluntária.
Depois, juntamente com a Rosinha Gayoso - outra heroína! - passou horas sem fim na Clínica Oftalconde, durante as minhas complicadas operações, os tratamentos, as consultas.
Mais tarde, quando já podia sair à rua, cheia de medo de tombar, nos passeios, de atravessa ruas, de andar normalmente, acompanhava a inválida, de braço dado...
Para tudo, até para reuniões de Câmara e Assembleia Municipal.
Imcomparável! Fantástica! A Docas, no seu melhor!
Esteve semanas, meses a fio connosco. Nem há palavras para descrever tanta energia e generosidade, em momento de crise...

Maria Manuela Aguiar disse...

Não fui a única beneficiária da sua infinita bondade.
Outros:
A Ana, noites inteiras, no hospital, de maca para um e outro lado, que a Docas empurrava, à falta de quem o fizesse, profissionalmente.
O Tio Gustavo, na urgência, quase em coma - noite e dia, também...
A Mãe dela.
A minha Mãe, em horario diurno.
Agora, a Olívia...
A criancinha Laura, quando necessário...
E mesmo, nas férias de 2008, em pleno Agosto, os cães da Zé.
Foi dog-sitter, durante 10 dias, sozinha, em V N de Gaia, num belo condomínio fechado, onde eu não acerto com o caminho, tantas são as rotundas, para lá chegar! Se assim não fosse teria tido a minha visita frequente. assim, falávamos pelo cell.

Maria Manuela Aguiar disse...

A Docas é feita de contrastes!
Quando era criança e jovem, o seu absoluto desinteresse por tarefas domésticas (porque se haveria de ralar, quando havia responsáveis pelo pelouro?)levava o Nestó a dizer,com um já bem vivo sentido de humor, que, depois de casar, o marido ao chegar a casa teria dificuldade em a encontrar, no meio da confusão e desarrumação generalizada.
A profecia não se confirmou!
Comprou o seu andar, junto ao Palácio da Ajuda, com vista para o Tejo, e é uma dona de casa esmeradíssima.
Tudo tem lugar certo, a arrumação é perfeita, o ambiente muito acolhedor.
Da herança de família quis pouca coisa - apenas os móveis de que gostava muito: um contador indo-português (que é uma beleza, oriundo de casa da Avó Mimi Ascensão) e uma pequena cómoda romântica, da mesma proveniência. O resto é novo, prático, moderno.
Aguarelas e variados estilos de pintura nas paredes. Portas e janelas sem cortinas. Casa de banho muito bem remodelada, com um quadro de azulejos, que lhe dá a maior graça.
Armários bem encaixados nas paredes, a aproveitar o espaço. Algumas portas interiores removidas, para criar mais espaço.
Um pequeno tapete persa muito bonito - dado pelo Fernando.
E, se o Fernando, por acaso, ao jantar, deixa tombar uma infíma migalha no chão, irrita-se...
Òs jantares, no apartamento da Rua do Guarda-Jóias são magníficos. Quando cozinha o Fernando, é quase sempre "pasta" italiana com môlhos deliciosos.
A Docas, em regra, opta por assados, que lhe saem muito bem. Tudo por relógio, minutos contados!...

Maria Manuela Aguiar disse...

Ainda do tempo de adolescência, quando o Nestó fazia os tais comentários jocosos, e quando a Docas era, de facto, uma menina despreocupada com tudo, e muito alegre, foram os dois ao cinema ver um filme do Cantinflas.
Ela ria-se, tanto, aos saltos na cadeira, que um casal de velhinhos, ao lado, em vez de ver o filme, preferia divertir-se a ver a Docas...

Maria Manuela Aguiar disse...

Ver uma comédia com a Docas, era,assim , uma dupla comédia.
Mas, às vezes até as tragédias do ecrã acabavam por suscitar reacções contrditórias.
Com a Lecas, foi, no Porto, ver um filme cheio de acontecimentos infelizes, com a Elizabeth Taylor, no papel principal.
Pergunta uma à outra:
"Estás a chorar?".
Resposta:
"Estou, também estou a chorar".
E começaram, de imediato, as duas a rir-se, perdidamente...

Maria Manuela Aguiar disse...

A idade traz consigo evoluções...
Dantes, quando morava com a Maria, comigo e com a Endora, na Av. do Uruguai, a Docas pouco ligava à minha cadelinha.
Não tinha autorização para entrar nos seus domínios. Como era muito esperta, não entrava, excepto atrás de mim e com ar de desafio, como quem diz: "atreve-te agora a pôr-me fora".
E, como era pelo tempo de uma conversa, a Docas condescendia na sua presença.
Embora fale dos cães da sua infância, com saudade, eram animais que a Tia Lola não consentia dentro de casa. E a Docas devia achar que assim é que estava certo...
Até um dia.
O dia em que tomou conta, já não sei porquê, da cadelinha da Ana, uma boxer espectacular - no sentido de que era um espectáculo de saltos afectuosos, com qualquer visita e, também muito inteligente - tudo mudou.
Uma mãe adoptiva exemplar!
E, desde então, adora cães e gatos. É muito popular com os meus gatos mais novos, mãe Tita e filho Dragão, que frequentemente se sentam no seu colo, enquanto vê televisão.
E, imaginem, é, igualmente, muito popular com as crianças - não só com a Laura, mas também com a Madalena.

Maria Manuela Aguiar disse...

Há pouco estive tentada a dizer que a Docas não brincava com os meus cães, olhava todos os animais com indiferença, embora fosse incapaz de os maltratar, incapaz de "fazer mal a uma mosca".
Mas as moscas talvez fossem a excepção. Não é certo.
Eu matei muitas, com o Nestó e a Lecas, na Freixeda. A Docas não tenho a certeza...
Até organizávamos concursos. Ganhava quem matava mais.
Havia tantas, tantas, pousadas nos tampos das mesas, que as apanhávamos aos magotes, num fechar de mão. Cada um de nós tinha, à frente, um recipiente com água, onde as depositávamos (e afogávamos...).
No fim, fazíamos a contagem.
E tinham muita utilidade. O Nestó usava-as como isco para a pesca.

Lembro-me. hoje com horror, de ter participado na chacina das moscas.

Agora, apesar de Obama ter relançado esse desporto, já não sou praticante.
A única que continua, como o Obama, com mão certeira é a Xaninha.
Já vi. Se não visse, não acreditava.
Mas aqui, em Espinho, moscas há poucas, comparativamente.

Maria Manuela Aguiar disse...

A serena e tranqquila Docas, de vez em quando, tem tendência para decisões impulsivas e irreversíveis - até porque, sendo "carneiro", de signo, é muito teimosa e não volta atrás.
Um exemplo:
Depois de anos na Caixa de Doenças Profissionais, onde todos gostavam dela, onde o ambiente era familiar - um serviço pequeno, simpático, com relativamente pouca gente - de repente, acha que tem trabalho de menos, rotina a mais, e concorre a uma vaga na Caixa Nacional de Pensões, onde não conhece ninguém e nem sequer tem vantagens materiais. Só mais trabalho "chato", burocrático...
E lá ficou até ao dia da reforma, que procurou apressar o mais possível...
Agora, finalmente, é uma mulher livre, com tempo livre, com "hobbies".
A vida recomeça aos 60 e tal!
No caso dela, realmente, para melhor.

Maria Manuela Aguiar disse...

Tempo livre para ler - sempre gostou e agora pode, ilimitadamente.
Pode levantar-se por volta do meio dia e ir, então, tomar o pequeno almoço ao café.
Pinta, sempre ao som de música, e lê, enquanto as tintas secam.
Às vezes convenço-a a acompanhar-me em longos passeios à beira-mar. Outras vezes, não. Alega cansaço...
Vê novelas brasileiras com a minha Mãe e programas tipo "Eixo do mal" comigo.
É fã do Angelo Correia, em debates da Sic Notícias.
Mas não tem partido.
Vota em quem lhe apetece, caso a caso...
Do PSD para a esquerda.

Maria Manuela Aguiar disse...

A Docas é mais voltade para as artes do que para desportos.
Temos ido exposições temporárias em Lisboa e no Porto, ou ao cinema (o último filme, aqui em Espinho, foi um divertidíssimo Woody Allen - "Vicky Cristina Barcelona). Vai sempre de bom grado! Levar a Docas a um estádio é coisa mais difícil. Foi isso conseguido uma só vez, em nome não do espectáculo do futebol, mas do espaço arquitectónico em que acontece: ou seja, para ver, por dentro, uma obra-prima, o mais belo dos estádios do mundo, que é o do Dragão, concebido por Manuel Salgado. Não num dia qualquer, mas sim com a sua moldura humana, em tarde de jogo.
Um desafio de apresentação da equipa, precedido por vários números festivos de danças do Dragão chinês, e coisas semelhantes. Como soprava um ventinho glacial, a espera até ao começo do futebol (finalmente!) pareceu muito longa...
Estávamos em grupo, com o Guilherme e o Tózinho. Tirámos muitas fotografias, com o cachecol que a Docas teimou em comprar para oferecer ao Fernando - aquele que diz: SLB filhos da P---
Bem eu insisti num mal menor: outro cachecol com uma frase mais aceitável: o Benfica é uma m----.
Em vão.
Ela é de 8 ou 80...
Em todo o caso foi útil, porque a protegeu do frio!
Devo acrescentar que a Docas não foi a 1ª portista da família a exibir o indecoroso cachecol. Antes dela , o Alexandre, numa prévia ocasião festiva, convenceu o pai a comprar-lhe um igual. Era aquele, ou nada! Com uma diferença, ou mesmo duas.
Em 1º lugar, foi no fim do jogo, à saída, não entrou no estádio com ele ao pescoço. E, em 2º lugar, circunstância atenuante, ainda não tinha feito 10 anos.

Docas disse...

A propósito da minha visita a um terreiro de comdomblé, que a Manuela, mais acima conta, sem pormenores: foi uma experiência muito curiosa. Em Salvador da Baía há milhares de terreiros, onde se junta a fé cristã com a magia praticada pelos antigos escravos levados de Àfrica.
É ao anoitecer que começa a cerimónia. Fui acompanhada de um guia - achei que podia ser perigoso andar por aqueles locais sozinha. O terreiro tinha duas entradas abertas (sem portas), uma em frente à outra. A um canto havia um santo cristão, creio que era São Jorge a cavalo - muito comum no Brasil. Ao fundo da assistência, sentavam-se as Mães-de-Santo (mulheres idosas). Depois um grande espaço, onde as raparigas e rapazes, vestidos de Baianos, todos de branco, dançavam, ao som dos tambores, formando um grande círculo, uns atrás dos outros. Em frente, os homens que faziam a batucada, encontravam-se num estrado mais alto. Depois de muito tempo, paravam e com o pau batiam três vezes nos tambores, para o espírito descer - mas nada... Isto foi repetido de tempos a tempos. Eu já estava a desanimar - depois de muitas horas de espera. Até que, a certa altura, depois de tocaram, novamente, três vezes nos tambores, o espírito desceu e entrou nalguns dos baianos (não em todos)! Esses, andavam aos "pinotes" pelo terreiro e as Mães-de-Santo corriam para eles e atavam, à cintura, uma faixa branca. Este estado podia durar toda a noite...
Eu, de olhos esgugalhados, estava admirada e sem perceber parte da cerimónia. Eles transpiravam e, de vez em quando, abraçavam as Mães-de-Santo e falavam baixinho. Depois, os "pinotes" e o transe continuavam no terreiro! A meio, apareceu um preto muito grande, também vestido de branco, mas com grandes plumas na cabeça (suponho que seria o Pai-de-Santo). Entrou por uma das portas, possesso, e saiu pela outra.
Estranhíssima cerimónia, mas uma oportunidade única para mim, que tenho sempre curiosidade de ver como é...

Docas disse...

Outra história dos meus tempos da Sec Est Emigração.
Fui ajudar na organização do Festival da Canção Migrnte em Trancoso, terra do Dr. Victor Gil.
O espectáculo foi em pleno castelo. Teve uma audiência enorme, talvez por causa de um grupo brasileiro, em que as meninas dançavam muito despidas.
E foi transmitido pela RTP.
Um grupo de homens locais estava a construir o palco, sob as nossas instruções. Eramos vários, vindos de Lisboa, quase todos gente nova e formada.
Os trabalhadores tratavam-nos, a todos, por doutores e doutoras.
Eu, com os meus escrúpulos, disse a um , que me interpelava:
"Eu não sou formada. Por favor, não me chame doutora...".
Resposta dele, imediata:
"Sim, sim, Srª Doutora.
E doutora fiquei. Era inelutável...

Docas disse...

A minha Mãe tem reacções muito trágicas e excessivas aos internamentos hospitalares e cirurgias. Cá fora, conta as histórias, como se uma grande desgraça estivesse em curso. Lá dentro, dá imensas opiniões e interfere com o trabalho das enfermeiras - uma classe que nessas alturas não convêm irritar. E o doente, que só quer paz e sossego, precisa de alguém que o anime e não de profetas da desgraça como ela. Por isso, quando fiz uma histrectomia total, não lhe disse nada.
E ela de nada soube, porque quem sabia, a Xana e o Fernando ( que tratou de arranjar um bom operador e assitiu, ele próprio o colega) guardaram segredo.
Por pouca sorte, mal tinhamos os 3 chegado a casa, aparecem, de visita, a minha Mãe e o Tio Gustavo...
Estava tudo cheio de flores, e ela estranhava:
"OH, Docas, porque está a sala tão florida?"
Resposta pronta do Fernado:
"Nós temos sempre muita coisa a comemorar. Por ex. se nos zangamos e, depois, fazemos as pazes".
A minha Mãe acreditou...
Depois observou:
"Estás muito pálida, não te sentes bem?"
Resposta minha (era meio dia):
"Não é nada, Acordei agora. Quando me levanto, estou sempre assim".
Não me podia queixar, estava cheia de dores e morta que as visitas se fossem embora...

Docas disse...

Eu tenho um sono muito pesado - desde sempre.
Uma noite, o Fernando teve de ir ao Hospital Inglês, mas, como era só para observar, de urgência, um dos seus pacientes, não levou a chave de casa.
Disse-me:
"Não demoro".
Mas, entretanto, adormeci.
Quando chegou, tocou, tocou à campaínha e ... nada de resposta.
Sentou-se na escada e, de vez em quando, voltava a tocar, furiosamente!
Pensou chamar os bombeiros, mas pôs o ouvido na porta e ouvia o meu ressonar. Morta não estava...
Sempre tivemos o hábito de ter, no interior da casa, as portas todas abetas, inclusive a do quarto de dormir.
Nessa época, não havia telemóveis.
Foi à rua e telefonou de uma cabine pública - o telefone ficava na mesinha de cabeceira...
Mas nem isso resultou!...
Resolveu, então, ir dormir, no hospital Inglês, em cima de uma marquesa, e levantou-se muito cedo, antes da maioria das enfermeiras entrarem de serviço...
Voltou, então, a ligar o telefone e, finalmente, eu acordei e atendi o telefonema.
"Que grande partida me pregaste. Já vou aí a casa".
Mas eu, ensonada, vi os ponteiros do relógio ao contrário e pensei: .
"Olha esta! Disse que não demorava e, afinal, já são 2h da manhã...".
Tornei a deitar-me.
Quando lhe abro a porta ele diz-me:
Arranja-te depressa, que são quase 8horas. Vou só fazer a barba e levo-te já ao emprego..."

Docas disse...

Aconteceu-me uma coisa parecida em casa dos Castelões - a Sara e o marido, que tinham uma farmácia em Malange. Fui lá passar um mês de férias, com eles e as 4 filhas, que dormiam no mesmo quarto em beliches.
Enquanto lá estiva, as 2 mais novas dormiam por cima da minha cama.
Uma noite, a mais pequena caíu do beliche. O estrondo foi enorme. Ela chorou. Deram-lhe água. Verificaram que não tinha nada partido.
Eu continuei sempre a dormir, não dei por nada.
Só soube da ocorrência no dia seguinte...
E eles comentavam:
"A casa podia cair-te em cima. que tu não acordavas!".

Docas disse...

Isto foi muito útil, em Luanda, durante os tiroteios nocturnos, depois do 25 de Abril.
Eu dormia, como se nada fosse.
Para mim, dormir è sagrado!
Às vezes, o meu Pai, muito alarmado, ía ao meu quarto, a procura de companhia para enfrentar o susto. Sem resultado.
"Docas, ouviste este grande estrondo de bomba?"
(a casa até estrmecia!...)
E eu, muito irritada:
Oh Pai, deixe-me dormir descansada. Estava a dormir tão bem!"
Voltáva-me para o lado e pegava no sono, de imediato.

Anónimo disse...

Dizia a Tia Lola, quando a Docas era pequena:
"Tu és como os burros. Quando te chateias, dás uns coices e deitas a albarda ao ar".
Em pequena, isso acontecia poucas vezes. A minha imagem dela é de uma menina dócil e permanentemente bem disposta.
Mas, quando lhe dá para perder a paciência...
Com a idade, a paciência está um bocadinho mais desgastada, lança mais vezes a albarda ao ar!
E como é muito teimosa, às vezes, as coisas complicam-se.
Neste momento, recusa contar histórias engraçadas das suas férias com o Fernando por Itália, Suiça, Inglaterra, etc. Bem que eu insisti, como dizem os brasileiros. Já vai embora amanhã e tão cedo não "bloga".
Outras histórias que ficam por contar são as do gato inglês. A menos que ainda mude de idéias. Para já, condescendeu, apenas, em falar da LIRA...

Docas disse...

A Ana tinha uma cadela de raça "boxer", que pôs o nome de Lira. Ia com ela para todo o lado -ensaios no teatro Universitário de Braga e mais tarde, quando foi para o Porto, levava-a todos os dias para o Conservatório de Música e de Artes do Porto. Viajava sempre de comboio, com a Ana, qundo se deslocava para longe de casa: Lisboa, Porto ou Moura, no Alentejo. Era uma cadela estimada por todos - tinha muita vivacidade e adorava pessoas! Mas, com outros cães era um perigo, pois gostava de lutas! Numas férias da Páscoa, a Ana pediu-me para ficar com ela em minha casa, na Ajuda, em Lisboa. A adaptação foi difícil - faltava-lhe a dona. Notava que se sentia perdida e insegura, num ambiente estranho.
Mas, depois, afeiçoei-me tanto à Lira, que decidi tomar conta dela. Eu trabalhava todo o dia e para ela não ficar sozinha, arranjei-lhe um "ama", a quem pagava € 100,00 por mês. Durante o dia, ficava em casa dela (mesmo ao lado da minha), com os pais e uma filha de 3 anos, e levava-a a passear duas vezes por dia. O Fernando aparecia quase todas as noites e jantavamos juntos. Ela fazia-lhe uma grande manifestação, aos saltos, tanto à chegada como à saída. Sempre que acompanhava o Fernando à porta, lá ia também a Lira, fazer a sua despedida, com grandes saltos. Só quando havia uma grande discussão entre mim e o Fernando, eu, ofendida, não me levantava do sofá e ficava a ver televisão. Nessas alturas, a Lira ficava sentada ao meu lado (parecia um cão de porcelana) - nem se mexia para acompanhar o Fernando à porta como era costume. De longe ficava a olhar para ele, com um ar de desafio, como quem diz: Vai-te embora e não chateies mais a minha dona!

Anónimo disse...

Maria Manuela disse:
Para quando a próxima expo da Docas?
"Passagens de luz" está pronta a ser exibida - e, se demora muito mais, ela acaba por não ter quadros para venda. pois vamos reservando para nós os que mais gostamos.
O Fernando, então, é um verdadeiro açambarcador de "arte- Docas"...
Estou a pensar fazer outro tanto com a sua experimentação sobre desporto.
Ainda por cima, ao contrário do que aconteceu com as colecções anteriores, esta do desporto é mais controversa... Mas eu sou fã!
Em breve, mostro as fotos, para darem opinião.

Anónimo disse...

Docas disse
Esta tarde, estivemos a falar da nossa infância, dos tempos da escola.
O melhor tempo, para mim, foi o da Freixêda. A 1ª profª chamava-se Zélia e era um terror. Era das que batia nas crianças com palmatória. Apesar de ser boa aluna não gostava nada dela. A certa altura, resolveu casar e foi-se embora. Veio, então, outra, boazinha. Tinha uma sobrinha e afilhada, que vivia com ela e que era muito mal comportada. Não lhe tinha respeito nenhum. Abusava... era divertida. Quando estávamos a estudar o período da Dona Teresa e Dona Urraca, pôs-se a gritar, assim:
Dona Urraca
dava peidos como uma vaca!
Era deste género. Estão a ver...
Eu brincava com ela, às vezes, em casa da ProFª, que me achava uma menina admirável, cheia de virtudes, muito aplicada...
Um dia, a ralhar com a afilhada, que náo tinha ainda feito os deveres, deu-me como exemplo:
Faz como a Eduarda! Tenho a certeza de que ela já tratou dos "deveres". Não é verdade, Eduarda?
Não era, eu não tinha tratado de nada e não sabia mentir. Fiquei vermelha como um tomate e respondi: "não, não fiz ainda os deveres".
Mas continuei popular, para tia e sobrinha

Anónimo disse...

Docas disse
Esta tarde, estivemos a falar da nossa infância, dos tempos da escola.
O melhor tempo, para mim, foi o da Freixêda. A 1ª profª chamava-se Zélia e era um terror. Era das que batia nas crianças com palmatória. Apesar de ser boa aluna não gostava nada dela. A certa altura, resolveu casar e foi-se embora. Veio, então, outra, boazinha. Tinha uma sobrinha e afilhada, que vivia com ela e que era muito mal comportada. Não lhe tinha respeito nenhum. Abusava... era divertida. Quando estávamos a estudar o período da Dona Teresa e Dona Urraca, pôs-se a gritar, assim:
Dona Urraca
dava peidos como uma vaca!
Era deste género. Estão a ver...
Eu brincava com ela, às vezes, em casa da ProFª, que me achava uma menina admirável, cheia de virtudes, muito aplicada...
Um dia, a ralhar com a afilhada, que náo tinha ainda feito os deveres, deu-me como exemplo:
Faz como a Eduarda! Tenho a certeza de que ela já tratou dos "deveres". Não é verdade, Eduarda?
Não era, eu não tinha tratado de nada e não sabia mentir. Fiquei vermelha como um tomate e respondi: "não, não fiz ainda os deveres".
Mas continuei popular, para tia e sobrinha

Anónimo disse...

A ida para a Mina da Bica, a meio da 4ª classe, foi traumática.Não porque a profª embirrasse comigo. Não! Até era simpática. Mas eu entrei em regressão. Gaguejava, não aprendi absolutamente nada. Passei o exame da 4ª classe, graças à bagagem que trazia da Freixêda. Em história, valeu-me ter saído pergunta sobre a pré.história.
Depois, fui para o Porto, para a Escola Comercial e dei-me bem. Fui sempre boa aluna, ainda que não excepcional.

Anónimo disse...

A ida para a Mina da Bica, a meio da 4ª classe, foi traumática.Não porque a profª embirrasse comigo. Não! Até era simpática. Mas eu entrei em regressão. Gaguejava, não aprendi absolutamente nada. Passei o exame da 4ª classe, graças à bagagem que trazia da Freixêda. Em história, valeu-me ter saído pergunta sobre a pré.história.
Depois, fui para o Porto, para a Escola Comercial e dei-me bem. Fui sempre boa aluna, ainda que não excepcional.

Anónimo disse...

A ida para a Mina da Bica, a meio da 4ª classe, foi traumática.Não porque a profª embirrasse comigo. Não! Até era simpática. Mas eu entrei em regressão. Gaguejava, não aprendi absolutamente nada. Passei o exame da 4ª classe, graças à bagagem que trazia da Freixêda. Em história, valeu-me ter saído pergunta sobre a pré.história.
Depois, fui para o Porto, para a Escola Comercial e dei-me bem. Fui sempre boa aluna, ainda que não excepcional.

Anónimo disse...

Coisa curiosa: nunca fui grande aluna a matemática, mas nos últimos anos, com uma boa profª, tornei-me a melhor aluna, na disciplina. Percebi a matéria desse ano e toda a que estava para trás. Fez-se luz no meu espírito!

Maria Manuela Aguiar disse...

Não te admires - é mesmo assim. De repente "apanhamos o fio da meada", com uma professora mais competente do que a anterior. Eu, em matemática, flutuei, com as professoras. Foram mais as más. Por isso só fui boa aluna em fases excepcionais, mas fui...

Maria Manuela Aguiar disse...

O que te aconteceu na Bica, na escola da Sortelha, durante um semestre, aconteceu-me, a mim, num trimestre da 2ª classe em Espinho, num ano em que os meus pais decidiram prolongar a época de praia até ao Natal.
Odiava a professora, a quem chamava "o cavalo espanhol". Sei lá porquê. Eu até gosto de cavalos!Essa megera também usava palmatória e comigo o método não funciona. Fui de mal a pior. Tornei-me uma insubordinada. Nos dias em que chegava, no comboio de Lisboa, a edição do "Mosquito" eu faltava às aulas. Duas vezes por semana!
Primeiro lia "O mosquito", de fio a pavio. Depois, lá ía afrontar a palmatória, com ar de desafio.
Graças a Deus, em Janeiro fui para a Escola do Magarão, em Avintes e voltei ao normal, com uma profª que me estimulava e gabava imenso. E, apartir da 3º classe, durante 7 anos, o meu destino foi o internato das Doroteias, o Colégio do Sardão, onde o ensino era de qualidade.

Docas disse...

Hoje estivemos aqui na conversa sobre outros tempos - sobre as ligações dos ramos de família de Gondomar. O meu Avô Ernesto Fonseca, depois de se formar em Direito em Coimbra, foi estagiar para o cartório notarial do bisavô Joaquim Mendes Barbosa, o pai da Avó Maria. Mais tarde, sucedeu-lhe no cartório de Gondomar.
O último cartório que chefiou foi a da Rua Sá da Bandeira, no Porto, por cima da "Brasileira". Lá me encontrei muitas vezes com ele. Vinha do Instituto Comercial e seguia com ele, de comboio, da estação de São Bento para a de Rio Tinto.

Docas disse...

Do lado Fonseca, o meu bisavô tinha uma frota de barco rabelos. Quando fizeram a barragem do Douro, lá para cima, a casa dele, uma grande casa em forma de U, ficou soterrada. Deram-lhe um indemnização em dinheiro, e ele, como o negócio ficou prejudicado, aceitou um lugar dechefe da estação de comboio de Rio Tinto.
Era um bonito homem - muito parecido com o Nestó, a avaliar pelo retrato que dele ficou.

Docas disse...

Esse bisavô morreu de uma forma súbita e trágica, quando um combóio explodiu na estação.

Docas disse...

Voltando muitos anos atrás: sei que ele casou duas vezes. Do primeiro casamento teve muitos filhos. Do segundo, apenas três, o mais velho dos quais, o meu Avô ernesto. Os outros eram bastante mais novos, ainda pequenos, quando aconteceu o acidente fatal. O meu
Av^prescindiu da sua parte na herança a favor da viúva, sua mãe, e dos irmãos menores.
Ele já estava formado pela Universidade de Coimbra e a trabalhar e achou que essa era a atitude correcta.
Mas parece-me que não manteve grande contacto com a família. Lembro-me de o ver cruzar-se com os dois irmãos na rua, de os saudar de passagem, sem parar para conversa...

Docas disse...

O bisavô Ascensão, pai da Avó Mimi era médico ortopedista e amigo do do bisavô Mendes Barboza, pai da Avó Maria.
Morava em Rio Tinto, na enorme casa antiga, onde passei uma parte da infância.
Eram ricos há várias gerações.
Só os santos dos altares da capela, alguns do século XVI, valeriam hoje uma fortuna...
A casa foi herdada pelo meu Pai. Depois do 25 de Abril, como havia o perigo de "invasões" populares, resolveu vende-la, mais a quinta, a uma ordem religiosa, para lá instalarem um colégio. Com a condição de manter umas divisões para sua residência, vitaliciamente. Foi aí que morreu, de ataque cardíaco fulminante, num post-operatório.

Docas disse...

A Tia Lena conhecia a casa do bisavô Fonseca. Falava de a ter visto antes e depois de submersa.
Era tão grande que, lá no fundo, continuava bem visível...

Docas disse...

É claro que foi o facto de ter mudado de vida e de terra, deixando o Alto Douro pare se fixar em Rio Tinto, depois da construção da barragem, que permitiu, depois, o convívio dos jovens Mimi Ascenção e Ernesto Fonseca!
Ele um homem muito alto e bonito, embora pouco expansivo, ela pequenina, muito viva, e muito comunicativa. Sempre a dizer graças. Usava muio provérbios e ditos populares.
Mas não era uma simples senhora à moda antiga, antes também uma hábil administradora dos seus bens...