terça-feira, 12 de maio de 2020

Os últimos anos da década de 20 foram enlutados e tristes ena Vila Maria. Depois da morte a vida continua, diz-se… mas não,  ali não continuaria igual ao que fora. Ao que teria sido com o pai. Outro caminho teria sido aberto e percorrido com aquela ousadia e bom senso, que levara António Carlos Aguiar tão longe e tão depressa no seu percurso brasileiro. Ousando iniciativas, em grande, e conseguindo resultados, com segurança.
A sua partida, tão cedo, legou aos filhos uma fortuna considerável, que se iria gastando e desgastando, na falta do seu génio para a dinamizar e reconverter, em cada conjuntura. Parte dessa herança eram, também, hábitos e despreocupação de milionários, que viúva e filhos mantiveram no estatuto, na vivência ena aparência, cada vez menos assentes na realidade. Bastou, sempre para a casa grande, criados, férias na praia, nas termas, bons colégios, e até mesmo dispendiosos atos de beneficência materna. Se não era o estadão dos tempos do pai, não andaria muito longe. Da parte material se encarregava, com senso e prudência, mesmo não sendo homem de negócios, o Tio Alexandre, e, graças a ele, maior foi o mais prejuízo devido à catástrofe financeira de 1929, do que gastos desmesurados.
Para a viúva, senhora de grande inteligência, mas pouco dada a números e a poupaças, muito pior do que o qualquer declínio de rendimentos, foi a perda da companhia do seu idolatrado marido, que lhe retribuia a paixão, e lhe sabia dar na vida tudo o que queria, com a sua arte de combinar, tão invulgarmente, o gosto pelo convívio e e pelo divertimento, com o gosto pelo trabalho.
Raras vezes um "amor à primeira vista", como o dele, resiste  assim às rotinas do casamento, às atenções divididas por oito filhos, a tantas separações temporárias... A mulher vinha a Portugal, para que os filhos nascessem -  só não o pode fazer durante períodos da “grande guerra” em que o inimigo punha em risco a segurança da navegação atlântica. O marido estava a seu lado na vinda, com ela aguardava a chegada do bebé, partia com a certeza de os deixar bem – mãe e filho – e regressava a buscá-los após longas semanas de recobro, que então se impunham como necessárias. Há algumas cartas escritas, por ele, nesses dias expectantes de saudade mal contida, e é elucidativo da força da relação amoroso, a expressão de sentimentos, em tudo igual do noivo apaixonado dos cartões postais enviados entre 1908 e 1910... O testemunho dos filhos, consensual e inequívoco, vai, definitivamente, no mesmo sentido. "O Papá não sabia o que mais havia de fazer pela Mamã", diziam os mais velhos, e as manas pequenas, que não tinham memória nítida desse quadro da vida conjugal, haveriam de repetir a frase sempre que queriam traçar um perfil do Pai. Foi também por “ouvir dizer”, de fonte segura, que a Mariazinha, repetiria às filhas: "o meu pai só comprava coisas boas e caras, achava que "o que é barato sai caro". Ou: "o meu Pai adorava a luz, muita luz. Quando anoitecia, mandava acender todos os lustres e cadeeiros da casa".

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