terça-feira, 13 de janeiro de 2009

P28 - ANTÓNIO MARIA BARBOSA AGUIAR

O TIO ANTÓNIO - Uma serena forma de vida


António Maria Barbosa Aguiar, nasceu em S. Cosme, a 15 de Janeiro.
Casou com a Tia Toninha ( Antónia - António!), que conheceu em Santo Tirso, onde estava, então, a começar a vida profissional. No dia 28 de Agosto de 1943 (o dia de anos da minha Mãe, também chamada Maria Antónia). A noiva era lindíssima.
Tiveram quatro filhos: Inês Maria, Maria Madalena, António e Maria da Conceição.
Era o mais sereno, o mais discreto dos irmãos.
O único que parece ter herdado o talento paterno para os negócios. E, por isso, enriqueceu, depois de deixar de ser funcionário do Estado (tesoureiro da Fazenda pública, cargo que o levou a viver no Funchal, em Fafe, em várias outras cidades, e, finalmente, em Gondomar).
Tal como o Pai (e ao contrário dos manos Manuel e Zé) gostava de se arranjar muito bem. Sempre sóbrio, de fatos completos, com o seu chapéu a condizer. Sempre simpático, cortês, sorridente.
Dizia uma senhora, que eu nem sei quem era, no dia do seu funeral: "Desapareceu o último senhor de Gondomar. Não há mais ninguém, assim, tão delicado, tão conversador, e tão bem vestido ".
Ouvi e dei-lhe razão. Não apenas pelo seu aspecto ou pelas boas maneiras, também por uma filosofia, uma forma de estar na vida e de se relacionar com a família, com os amigos, com conhecidos e desconhecidos!


Cartas às Irmãs

Da caixinha, uma carta da mãe para o irmão António - coisa rara. O normal é encontrarmos uma larga colecção das cartas recebidas, porque a Mª Antónia era uma coleccionadora metódica. Ninguém, na sua geração, fez outro tanto com as cartas dela, ou de outrém... Porque é que esta voltou à origem?
Pode ter-se esquecido de a enviar,
pode tê-la recuperado, quando o irmão, ainda solteiro, voltou à Villa Maria, e a deixou à vista, numa secretária - ou no caixote do lixo. Não vamos saber isso nunca.
terça-feira, 20 abril, 2010 
Maria Manuela Aguiar disse...
Do Porto, a 4 de Março de 1938

(...) "Faço idéia a desordem que aí não irá, todos pouco mais ou menos novos e amigos de se divertir! Sendo tu o mais novo, eles já não o são muito. Então encontras no teu quarto roupa desconhecida, boa limpeza, não haja dúvida! Há criadas? Ou és tu que arrumas o quarto? É o que me está a parecer, para ele estar assim tão arranjado. Tudo isso deve ser divertido.
O rádio quanto custou? Que marca é? Há aí muitas raparigas? A terra é bonita? Divertiste-te muito no carnaval?
Nós divertimo-nos bastante. Fomos no domingo e na terça ao cinema. Na terça esteve mais animado, jogou-se muitissimo. Estivemos com a Amélia e com a Mª da Graça no camarote. Foi um pagode. Mas hoje já estamos fechadas no convento. As férias deviam ser infinitas.(...)
Fiquei muito contente com a tua carta, por ela ser muito grande. Sempre que possas escreve-nos assim. Responde-me a tudo.
Recomendei-te à Amélita e ela, do mesmo modo, me pediu para te dar cumprimentos. Continua em Matosinhos, se lhe escreveres é para lá. Falei com ela, como pedias, e ela respondeu-me que receberia com muito prazer as tuas cartas."
terça-feira, 20 abril, 2010 
Maria Manuela Aguiar disse...
Como estou a transcrever as cartas ao acaso, conforme as encontro, só agora me dei conta de que a carta em que o Tio relata o seu carnaval e alude à beleza das meninas madeirenses é a resposta a esta inquérito cerrado da da mana Maria!
Mas não deu resposta a todos os quesitos - eram demais. Pena porque gostaria de saber a marca do rádio, por exemplo!
E quem seria a Amelita? Uma das primas de Matosinhos? Vou averiguar.
A mãe, já então mostrando a sua veia casamenteira, ainda faz uma última recomendação ao irmão, em P.S.
"Esquecia-me de te dizer que a Amélinha faz anos no dia 1 de Abril".
terça-feira, 20 abril, 2010 
Maria Manuela Aguiar disse...
A carta do Tio Tónio está transcrita em comentário à mensagem sobre as suas quadras de S. João.
terça-feira, 20 abril, 2010 
Maria Manuela Aguiar disse...
Acho estas cartas muito reveladoras, tanto das pequenas coisas de um quotidiano de tempos perdidos - a importância de ter um simples rádio, o gozo de uma mera ida ao cinema, a "jogar" as brincadeiras de carnaval do alto de um camarote de teatro - como de estados de alma, e da mentalidade das meninas de colégios internos, que se sentiam encerradas num convento. (e o Colégio da Esperança nem sequer era um colégio de freiras!).
terça-feira, 20 abril, 2010 
Maria Manuela Aguiar disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
terça-feira, 20 abril, 2010 
Maria Manuela Aguiar disse...
A correspondência mostra também a amizade e camaradagem entre os irmãos Aguiar, apesar da diferença de idades, de temperamentos, de vocações...
O Tio Tónio, no seu relacionamento com as manas mais novas, parece estar a meio caminho entre o irmão e o pai, que não tinham já!
terça-feira, 20 abril, 2010 






























2 comentários:

Maria Manuela Aguiar disse...

Vi, pela última vez,o Tio Tónio, quando ele estava internado, num agradável quarto particular da Casa de Saúde, no Porto.
Apesar de avaliar, certamente, o seu estado físico, mantinha a boa disposição - era o mesmo de sempre, sorridente, dando mostra constantes do seu bom humor e suave ironia . À despedida disse-nos: "hoje vou ter um dia muito preenchido, a assistir, na tv, os funerais da Princesa de Gales". Era, de facto. o dia das exéquias de Diana, com transmissão directa para o mundo.
Um ou dois dias depois, entrou em coma. Estivemos lá, no mesmo quarto. Com ele já inerte. Sabendo que nunca mais poderíamos conversar com ele. Tristíssimas desoladas.
Mas que exemplo de coragem ele nos deu, até ao fim! O caracter das pessoas é nestas alturas que se define.
É, sobretudo, por esta postura perante a vida e a morte, e não só pelas boas maneiras e pela elegância de atitudes e de trajes, que chamei ao Tio António um verdadeiro "Senhor".

Maria Manuela Aguiar disse...

Ontem, por acaso, a folhear um caderno antigo do tio Manuel, e à procura de um soneto da Tia Lina, encontrei um soneto do Tio Tónio, feito pouco depois da morte do Pai. Tinha ele, suponho, 11 anos.
É triste, triste, e dá-nos a ideia do choque e do sofrimento daquelas crianças. Como se o casarão estivesse vazio, e a vida não fizesse sentido. E como se a Mãe não lhes pudesse valer...
Ei-lo:

Meu Pai?!...

Quem te levou, meu Pai?...Quem te levou?
Para esse mundo assim, tão azulado
Responde, sim. Teu filho,um desgraçado
E para quem a tua ausência já aterrou

Pr'a esse mundo sem fim, quem te arrastou?
Partiste!...Fiquei só!Desventurado.
Pede a Deus a quem eu tenho rezado,
Embora infeliz, e pr'a quem tudo secou

Partiste...Morreu tudo neste mundo.
E a minha Mãe, oh Pai, sempre a chorar.
Eu sempre choro desde o dia em que moribundo,

Te segurei. Morreste,Pai...Agora, então
Depois de tudo, me vês sempre chorar.
Chorará, eternamente, Senhor, meu coração.

Os versinhos estão escritos a lápis, em letra ainda infantil, e algumas palavras são praticamente ilegíveis. Por exemplo,o "aterrou".
Será?
Apenas se lêem muito bem as que foram, desenhadas por cima, a tinta da china.
De qualquer modo, vou reproduzir, no blogue, o original
E por mim, considero quase um pequeno milagre, este achado, com valor sentimental infinitamente superior ao seu valor literário.
Claro, este tem de ser visto em relação à muito pouca idade...
Mas, a mim, só me interessa o que, tão bem, tão sinceramente, o pequeno António Aguiar nos transmite. Admirável.
Imagino-os a todos nessa casa, que foi, mais tarde, também a minha.
Cirandando, cabisbaixos, por espaços que me são familiares, tal como as mobílias dos seus quartos, a cor das colchas, o piano, o relógio grande da sala de jantar, que ,depois, foi herdado pelo Tio Tónio... Estou a vê-los, como os conheço das abundantes fotografias do album da Avó.