quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

W63 - MARIA ALEXANDRA AGUIAR DA FONSECA

O TALENTO E O "CHARME"

Maria Alexandra Aguiar da Fonseca, nasceu em Gondomar, na Vila Maria, em 28 de Janeiro de 1948.
Esse dia está, de uma forma muito especial, gravado na minha memória. Passei horas, com o Nestó e a Madalena, a olhar os céus, através do vitral gigante, que marcava o patamar de divisão entre o primeiro e o segundo piso da casa da Avó, e que oferecia a mais ampla das vistas para detectar a chegada da cegonha. A cegonha, segundo nos disseram, traria a criancinha pelos ares. A irmã ou irmão do Nestó, a minha prima ou primo. Esperamos, como imaginam, em vão... E eu, a certa altura, já farta da longa espera, resolvi ir fazer visita à Tia Lola, no preciso momento em que nascia a menina! Foi um segundo alvoroço, a acrescer ao principal... Toda a gente (por tal se entendendo, pelo menos, o Tio Manuel, a Tia Clarinha, a minha Mãe e a Avó Maria...) julgou que a terrível e imprevisível criancinha tinha visto o que não era próprio para a sua idade... Engano! Disso não tenho qualquer recordação. Só do facto, bastante suspeito, de me mandarem embora, com tanta pressa e tanta vozearia, tipo "olha a menina!". Fiquei com curiosidade. Saí e esperei apenas uns minutos para voltar aquele palco demovimentações misteriosas e interessantes. Dessa segunda vez, surpreendi o Tio Manuel - que, como acontecera comigo e com a Lecas, fazia o papel de médico parteiro, com eficiência - a bater no bebé, suspenso pelos pés e fiquei indignadíssima! A chorar, perante a aparente barbaridade de um Tio, até aí tão simpático, fui defender a recém nascida, batendo eu no agressor... Um bébé gordinho e muito vermelhusco. Quando recuperou desse transe genesíaco, revelou-se a mais bonita das meninas, com a sua testa muito alta (dizem que denuncia proporcional grau de inteligência e, no caso dela, é rigorosamente verdade), e os seus enormes e expressivos olhos verdes. Este é o "meu" princípio da "sua" história.
Parabéns,

Manela

CV BREVE
Escola primária a peregrinar pelo país, com os pais: Freixeda, Sortelha, Espinho (dois meses) e, de novo, Sortelha. Exame da 4ª classe na Guarda.
Curso da Escola Industrial: Porto (Escola Aurélia de Sousa), Setúbal e, depois, Lisboa (Escola Josefa de Óbidos).
Apesar do direccionamento técnico do curso e dos 19 a matemática, tendia para as letras. Escreveu inspirados poemas desde os 11 anos e até aos 40. Estão compilados pela Docas.

Profissão

Em Novembro de 64, o 1º emprego. Tinha 16 anos. Foi secretária de um milionário, Charles Simoulin, que morava ao lado do rei Humberto de Itália. Queria adopta-la, queria que continuasse a estudar. A Tia Lola não permitiu.
Concorreu depois à CUF. Entre mais de 1000 candidatos, escolheram 3, sem cunhas, através de testes psicotécnicos - um deles a Xana. O ordenado era enorme, tudo corria muito bem até que a mãe decide ir para Luanda, sem lhe deixar alternativa - teve de seguir com ela e perdeu o lugar...
Em Angola, foi secretária do dr. Pinto de Andrade no Instituto da Indústia da Pesca. Por trabalhar com ele, chegou a ser chamada à PIDE...
Estava, de novo, bem integrada e satisfeitíssima, quando a mãe resolveu voltar a Lisboa. Mais um recomeço! De início, à falta de melhor, vendia enciclopédias da Caxton. Logo depois foi secretária do dr. Roger Carp, até que a mãe a faz regressar com ela a Angola. Por algum tempo. Depois, reinserida em Lisboa, sem trabalho, viu o anúncio de um concurso para a Trefilaria. Noutro vasto conjunto de candidatos, foi seleccionada e gozou de mais um sumptuoso estatuto remuneratório. O casamento, ao fim de poucos anos, levou-a para outra cidade - Leiria. Procurou novo emprego - Nissan, Montepio.
Começou, então, um percurso de emigração: França, onde vivia a Docas, por poucos meses. África do Sul, Joanesburgo. Primeira colocação numa agência de viagens, segunda na empresa do comendador Bernardino Faria. Esteve prestes a entrar na redacção do jornal "Século de Juanesburgo", mas desistiu dessa experiência, porque já pensava no retorno à pátria.
Em Lisboa e arredores, nova carreira: secretária ou dama de companhia de milionárias.
Primeiro, por escassos meses, uma excêntrica Mariazinha Braga, de quem poderá contar histórias divertidíssimas, seguidamente uma verdadeira Senhora de quem gostou muito: Dona Eugénia de Mello, com quem esteve 6 anos. Um acidente, uma operação ao ombro, deixou-a "de baixa" durante 18 meses. Foi substituída, é claro. Mas, quando recuperou, o cunhado de Dona Eugénia, José Manuel de Mello, contratou-a para tomar conta da Quinta dos Perdidos, no Alentejo. Outra época aurea! Tinha uma casa linda, gostava do trabalho, do ambiente, dos animais.
Uma mirabolante oferta de emprego de um misterioso milionário francês - com fabuloso vencimento! - convenceu-a a deixar a Quinta dos Perdidos. Em má hora...
Não chegou a concretizar-se!
Solução: emigrar, mais uma vez. Inglaterra, onde a contrataram como governanta e a puseram a lavar pratos, o que, naturalmentem recusou, de imediato. Suiça, onde foi secretária de uma cantora de ópera (casada com um milionário), na altura em que a Ana estava casada com o espanhol Yuste. A separação da Ana e a vinda para Lisboa, logo depois do nascimento da Laura, fá-la perder outra magnífica colocação. A cantora era simpática, apreciava as suas qualidades e pagava bem por tarefas muito agradáveis.
Durante estes 5 anos tem sido, sobretudo, a Avó da Laura. De momento, está apenas à espera da reforma - o que não quer dizer que novas e extraordinárias oportunidades não possam surgir!




























































Publicada por Maria Manuela Aguiar em 15:35

Comentários

Maria Manuela Aguiar disse...
61 anos. Quem diria!Eu, bem mais velha, continuo a lembrar-me, sobretudo, dos tempos da infância Imaginem a menina com 9 meses. Ao colo da Tia Lina, na sala de jantar da Avó. Vem Inês, a terrível, fazer festas ao bebé. Começa devagar, acariciando as duas bochechas. Depois, aperta, mais e mais. E a criancinha, sentindo-se "apertada", levanta uma mão, já relativamente grande e forte, e dá-lhe uma sonora bofetada!

... A menina cresceu rapidamente. Aos 10 tinha quase a altura que tem hoje (passe o ligeiro exagero). E era toda despachada. Sabia o que queria. Por essa altura, um dia, veio comigo para casa dos meus Avós, em Avintes, e não havia "menu" que lhe agradasse - muito menos os bifes com batatas fritas, que, ali, eram a receita-chapa, quando a Lecas e eu tínhamos aquela idade . Estava eu muito preocupada, quando ela viu batatas cozidas - um "must" na dieta do meu Avô Manuel - e disse que era aquilo que lhe apetecia.Reguei as batatinhas, abundantemente, com azeite, e a Xana, para nossa tranquilidade e satisfação, repetiu várias vezes. Só depois vim a saber que esse era o seu prato favorito! Simplesmente batatas. A navegar em azeite!

Para quem não aprecia, particularmente, os prazeres da boa mesa - como é o meu caso - parecerá estranho que continue a recordar histórias ligadas á gastronomia.Mas as histórias são, já o povo o diz, como as cerejas. Interligam-se. Esta passa-se uns 10 anos mais tarde. A Xana estava de férias, connosco, em Espinho e íamos almoçar à Tia Lena, no meu 1º carro, que era um "Viva", de cor clara e assentos azuis.Resolvemos levar, para oferecer aos Tios, uma grande quantidade de papos de anjo, com óptimo aspecto. (O Tio David era grande adepto de doçaria, mas a Tia Lena controlava as suas dietas, com muito cuidado, embora, também, com suficientes excepções). Eu conduzia. A Xana levava o embrulho nos joelhos. Uma de nós, por altura da Granja, perguntou à outra: "Os papos de anjo são muitos. Vamos comer um cada uma?"Assim fizemos.Eram, de facto muito frescos, recém chegados de Aveiro.Achamos que podíamos repetir - só mais um... E, logo de seguida, outro, e outro, e outro... Até que a Xana me disse: "Agora já são poucos. É melhor acabarmos com eles". Assim fizemos. E não perdemos o apetite para o excelente almoço da Tia Lena. Juventude!

Como a Xana foi minha madrinha de casamento, a primeira cadelinha que o Manel e eu compramos em conjunto (ainda em lua de mel), uma linda perdigueira portuguesa, recebeu o seu nome. Ela gosta de cães, e por isso, aceitou, de bom grado, a homenagem. Mas, quando a perdigueira cresceu, tornou-se difícil segurá-la dentro de casa, e, com imensa pena, acabámos por dá-la a um caçador.Havia que comprar um sucessor.Fomos a um horto, perto do mercado do Bolhão - que desde que me lembro de aí passar, pela mão da Avó Maria, também vendia cachorrinhos supostamente de raça - e empreendemos a difícil escolha perante uma irrequieta e numerosa ninhada de "fox terriers". Eu queria trazer um magro e ladino, mas a Xana insistia na beleza da cadelinha mais gorda. Aceitei o conselho e regressamos a casa, no tal Vauxall Viva, a Xana de fox ao colo.Mas, a meio caminho, eu reconsiderei, e resolvi ir fazer a troca pelo meu preferido. Quando já estava perto da loja, a Xana grita: "Para! Para, que a cadelinha está a sentir-se mal. Vai vomitar".E, realmente, assim parecia. Parei. O animal tossia, engasgado, com ar muito doente. Condoí-me, fiz a vontade à Xana. Decidi: "Bem. Fica essa!"É incrível, mas é verdade. A "fox" percebeu que estava "salva". Curou-se, instantaneamente, não hesitando em dar claras mostras da sua felicidade recuperada.Era a raínha das cadelas espertas! A minha Mãe considerava-a "gente". (não era 100 por cento pura, mas tinha um formoso e expressivo focinho, preto e bege).Chamava-se Docas. Porém, nessa época, a Docas não era muito dada a cães... E ficava furiosa, se respondia ao chamamento "Docas!" e nós lhe dizíamos: "Estamos a falar com a fox".

83 comentários:

Maria Manuela Aguiar disse...

Nem tudo na vida da Xana foram pequenas histórias alegres, como as que contei.
Houve coisas relevantes e invulgares, como os empregos que conseguiu, ainda "teen-ager", sem cunhas nem favores, através de provas psico-técnicas, em grandes empresas. Classificando-se no topo dos topos, entre centenas de concorrentes, com mais habilitações académicas.(Por razões misteriosas, que ninguém na família entendeu nunca, a Tia Lola e o Tio Eduardo acharam que o filho devia seguir o liceu, num óptimo colégio privado, e, depois, um curso universitário, e as filhas a escola industrial ou comercial, a caminho, supõe-se, de um tradicional casamento...). E, por isso, a Xana tinha, então, apenas, o 5º ano do curso industrial. a que acrescia, inteligência e cultura muito superiores à média de qualquer liceal. Talento para as línguas vivas, talento para bem escrever português... Tudo o que falta àquele antigo 1º Ministro, oriundo desse ensino técnico, que julgava que "Os Lusíadas" tinham 8 cantos e que o Thomas Mann tinha escrito "A utopia"...

Maria Manuela Aguiar disse...

E houve, também horas dramáticas. Creio que nenhumas piores do que a saga do nascimento prematuro da Ana, no Algarve, e a viagem, em risco de vida para ambas, mãe e filha, de ambulância, daí até Lisboa. Depois, a menina, a Ana, internada, numa incubadoura, durante semanas, com a vida por um fio!

Anónimo disse...

Maria Antónia disse:
Parabéns, Xana!
Lembro-me muito bem daquele dia 10 de Setembro, em que me telefonaste para Gondomar, a participar que a Ana tinha acabado de nascer!
Nós estávamos em casa do Tónio e da Xaninha, porque o Tónio também fazia anos nesse dia. O dia de aniversário do casamento dos meus Pais, e teus Avós. Tu conseguiste descobrir-me aí. Foi uma dupla festa!

Maria Manuela Aguiar disse...

Nessa altura, realmente festejamos, em grande.
O susto veio depois, quando soubemos o horror da partida de emergência para Lisboa e as condições terceiro-mundistas em que, então,se atendiam casos como aquele. O bébé dependia da garrafa de oxigénio, que, a certa altura, começou a falhar. A mãe, com uma hemorragia, precisava de seguir a velocidade moderada. O esgotamento do oxigénio para a menina exigia velocidade máxima. A mãe queria salvar a filha, antes de se salvar a si, e pedia ao motorista que acelarasse. O homem, ao que parece, não obedecia... Por milagre, salvaram-se as duas, "in extremis"...

Maria Manuela Aguiar disse...

Fui, várias vezes, visitar a Ana, à Maternidade Alfredo da Costa,
vendo-a, de longe, através do vidro, na incubadoura.
Foi um tempo de incerteza e angústia!
Mas depressa se transformou numa bela menina.
A Xana, o Carlos e a Ana viviam num simpático andar, no Restelo, com o Tejo à vista. Ainda hoje me oriento, através de Monsanto, de Benfica ao Restelo, graças às visitas que, então,lhes fazia, com frequência. Aprendi o caminho.

matilde disse...

Querida Mãe!

Deveria transportar todas as palavras que compõem o livro da minha vida, para poder descrever o que sinto por ti...
Não há palavra alguma, frase por mais bela que seja, ou fotografia ilustrada, que possa tranpôr tais sentimentos!
São sentimentos...
Muitas vezes sou bruta, sou misteriosa, sou menos transparente... Insegurança, medo de te entristecer ou até talvez defesa.
No fundo, o que importa é a harmonia e, acredita que tenho lutado bastante para que a tenhamos.
Mãe, desjo-te acima de tudo saúde e Paz.
Um grande beijo de Parabéns.
Tua Filha, Ana

Anónimo disse...

Docas comenta: Qundo chegamos à Mina da Freixeda, Em Trás-os-Montes, próximo de Mirandela, a Xana teria três anos. Aí passou grande parte da sua infância e, por isso, completamente integrada no meio da aldeia, que era paupérrima. A sua grande amiga era a Maria "Minhota" da mesma idade, que vivia com os dois avós. Uma casa térrea, construída só pelo avô, com uma entrada e ao e ao lado um buraco sem janelas, com uma cama a um canto, onde dormiam os três.
Quando não se sabia onde estava a Xana, procurava-se na casa daquela amiga.
Várias vezes foi encontrada a comer com eles de uma gamela "comunitária".

Anónimo disse...

Docas comenta: Todos na aldeia eram grandes amigos da Xana e ela muito popular na aldeia. Por exemplo, quando morria alguém, ela estava sempre presente no velório, em casa da família do "morto", e no enterro. Eu, não me lembro de alguma vez ter ido a um funeral. Também não me lembro de alguma vez ter partilhado as refeições em casa de alguém da aldeia, ou de ter amigos com convivência regular. Por isso, quando lá voltamos de passagem numa férias a Trás-os-Montes, passados cerca de 40 anos, encontramos alguns habitantes que tinham emigrado pra França, depois das minas terem fechado e voltado à sua terra para construir uma casa e fazerem alguma agricultura nas terras. Eles lembravam-se, perfeitamente, da "menina Xaninha" e do "menino Nésto", mas de mim não houve ninguém que se lembrasse. Passei por aquela terra sem deixar memória. Era uma menina morena, de cabelos pretos e escorridos (igual a qualquer menina da terra) A Xana era branquinha, gorducha, bonita, olhos verdes claros e cabelos claros e aos caracóis. A beleza rara e muito apreciada naquelas terras - a acrescentar a todos estes dotes, também era uma criança comunicativa, alegre e simpática para todos.

Anónimo disse...

Docas comenta: A Xana,completamente à vontade no meio rural, deitava-se debaixo das cabras, puxava as tetas e bebia directamente o leite. Tal como faziam as crianças da aldeia. Também tinhamos ao fundo do quintal uma capoeira - as galinhas durante o dia andavam à solta pelos campos, mas recolhiam na capoeira, à noite, ou para pôr os ovos. Ora a Xana agachava-se, à espera que a galinha pusesse o ovo e, fazia logo um furinho de cada lado do ovo e ali o comia ainda quentinho.

Anónimo disse...

Docas comenta: Lembro-me da Mãe contar, que um dia, ouviu gritos e quando veio ver o que se passava, estava a Xana em cima de um rapaz a dar-lhe com a cabeça nas pedras da rua. Volta e meia andava à pancada com as crianças da mesma idade, coisa que eu, pacífica, não me lembro de alguma vez andar à bulha, a não ser com o Nestó - isso entre nós, era frequente.

Anónimo disse...

Docas comenta: Havia na aldeia, um Sr. Pimentel, o único homem rico da terra, com grandes olivais e lagar. Passava a maior parte do tempo em Lisboa, mas de vez enquando ia passar férias à sua casa da Freixeida - tenho ideia de ser uma grande casa. Popular entre pobres e ricos, a Xana também era convidada para almoços no casarão do latifundiário - uma personalidade conhecida em toda a região. Eu, claro, criança tímida e calada nunca frequentei esses acontecimentos sociais.
A Xana, como já se disse, adorava azeite.
Voltava para casa sempre muito indignada, porque "chez Pimentel" lhe deitavam só um fio de azeite nas batatas...

Anónimo disse...

Docas lembra: Também a professora, D. Zélia, o terror das crianças, ria muito com a Xana e ela podia fazer tudo nas de aulas (única sala para alunos da 1ª à 4ª classe). A única criança (parece-me) que esteve na escola e a D. Zélia ensinou-a as primeiras letras e o números, sem nunca lhe dar reguadas.
Continuando as recordações da Mina da Freixeda - com frequência, no Inverno, iamos, no Jeep, até à Serra de Bornes. A Xana chorava quase sempre, com frio e, reclamava que lhe doiam os pés,as mãos e queria ir para casa. Aliás, vê-se nas fotografias dessa época -está sempre com ar de chateada!

Anónimo disse...

Docas comenta: a Xana era a mais nova dos três irmãos, ou seja, tinha uma diferença de 4 anos do Nestó e 3 anos de mim. Nessas idades é uma grande diferença e, por isso, às vezes sofria às mãos dos irmãos. Houve um dia que eu e o Nestó, fechamos a Xana na coelheira e exigimos que ela comesse as couves cruas - só depois a deixavamos sair. Ainda hoje se lembra desse momento traumático...

Anónimo disse...

Docas comenta: Depois de termos ido para a Mina da Bica, íamos à escola por montes, através de trilhos e uma paisagem de grandes rochedos. Era ainda longe - ia a criada a acompanhar-nos e com a lancheira, porque só podíamos regressar a casa ao fim do dia.
A escola ficava junto ao Castelo de Sortelha, onde brincavamos todos os dias, nos intervalos das aulas.

Anónimo disse...

Docas comenta: Em Sortelha, a Xana conheceu uma viscondessa (tenho uma leve ideia de a ver na calçada de Sortelha, já idosa, de cabelo arranjado, a pele muito branca com pó-de-arroz e muito pintada). Comigo nunca falou, mas deve ter achado piada à Xana, pois convidava-a para lhe fazer companhia às refeições. Uma das vezes, lembro-me de que a Xana chegou a casa e disse que tinha comido açorda. Achava que não era prato próprio para servir na casa de uma viscondessa.

Anónimo disse...

Docas comenta: A Xana, quando completou a 4ª classe, foi estudar para o Porto. Eu, já lá estava, hospedada em casa da D. Cândida - uma senhora muito chique, alta, com um porte bonito e delicadamente cerimoniosa - as refeições, por exemplo, eram marcadas por um ritual. Depois de ela dar o início, comíamos todos sincronizadamente. Chamava a criada, fardada a rigor, com a sineta...
A minha mãe chegou comigo e a Xana, que ia principar o ano lectivo. Enquanto a D. Cândia falava com a Mãe na sala de estar, às tantas, a Xana, vinda das aldeias, como se estivesse no monte, tira um sapato para coçar o pé. Foi uma risota... com a Mãe a repreendê-la! Mas ela rapidamente se integrou no novo meio urbano!
Mas, mais tarde, numa refeição, ao partir a alheira, ela, a alheira, voou pela mesa adiante. Todos calados, como se nada tivesse acontecido, continuaram a comer. A Xana não podia era perder a sua "alheirinha". Portanto, com toda a a descontracção, estendeu o braço, pegou nela e pô-la novamente no prato. Eu, ao lado, queria rir, mas, com tanta cerimónia, não podia. Pus a mão à frente da boca e... fum, fum, fum, a tentar abafar o riso! Depois destes episódios, não houve mais quebras de protocolo!

Maria Manuela Aguiar disse...

Estamos aqui numa polémica de natureza histórica:
Facto assente, é o facto de a Xana ter ganho uma bicicleta, como 1º prémio do concurso de esculturas na areia, com uma esplendorosa sereia.
A Docas teima que esse acontecimento se passou em Sines. Eu tenho a impressão de que foi aqui mesmo, em Espinho...
Se isto fosse coisa antiga, ficavamos a discutir indícios...
Assim, amanhã, vamos, pura e simplesmente, perguntar à protagonista!

Anónimo disse...

Docas disse: O 1º prémio da Xana, com direito a bicicleta, na qual todos passeamos muito ( e onde eu aprendi a ser ciclista, já com 13 ou 14 anos) aconteceu em Sines. Em Espinho, noutro ano, a artista Xana recebeu uma menção honrosa, e o Nestó um 2º prémio. Eu própria, com uma cabeça de palhaço, também alcancei uma menção honrosa.
Foi o Nestó, quem, quando me viu a chorar, porque não sabia o que havia de esculpir, me sugeriu esse projecto, segundo ele, fácil.
Quanto à Xana, no ano da conquista da bicicleta, teve direito a notícia no jornal. Um dos comentários de que me lembro era sobre o facto de ela parecer a mãe das outras crianças todas... Na verdade, ela desenvolveu-se muito precocemente. Aos 10 ou 11 anos tinha a altura que hoje tem. E é alta!...

Anónimo disse...

Docas comenta: Nos princípios da década de 60, estavamos a viver no Cercal do Alentejo, junto à costa alentejana, com praias belissímas -nessa altura, ainda desertas!
Num Verão, foram passar férias a nossa casa, os primos, Manuela, Madalena, Manica e Quim - uma borga! Iamos com frequência, às praias dos arredores e, também, aos bailes em Sines - estavamos na idade própria (12, 13,14,15 e 16 anos) de apreciar esses "bailaricos". Mas, a maior parte dos rapazes pareciam-nos muito "pategos". Assim,as "tampas" eram frequentes, principalmente pela Madalena, que era muito vistosa e bonita: alta, olhos azuis claros, cabelos pintados de louro, sempre bem vestida. Claro, um "chamariz" para os rapazes. As vénias a convidarem-na para dançar, sucediam-se, ao mesmo ritmo que as "tampas". Mas, lá no meio daquela gente, descobrimos um rapaz lindo! Comentavamos e olhavamos discretamente para ele, à espera que ele viesse convidar uma de nós para dançar. Quem seria? O mais provável,a Madalena, é claro! Nisto, ele dirigiu-se à nossa mesa e faz a vénia à Xana (a mais nova de todas - ainda uma criança). Ficamos espantadas e desiludidas! Só mais tarde soubemos que, o meu Pai, ao ver o nosso entusiasmo pelo rapaz, sorrateiramente, dirigiu-se-lhe a pedir para convidar aquela menina ali - indicando para a Xana!

Maria Manuela Aguiar disse...

Falta no CURRICULUM uma actividade desportiva: A natação de competição em Setúbal.
Uma das vezes fiquei em 2º lugar, atrás do campeão nacional. Concorria com homens, não havia mais raparigas.

Maria Manuela Aguiar disse...

Outra lacuna do CV: as línguas.
3 anos de Alliance Francaise, em Lisboa, 2 no British e uns meses de alemão.
Era difícil continuar, com o horário dos empregos...

Maria Manuela Aguiar disse...

NAMORADOS - uma estranhíssima colecção.
O primeiro foi o Fidélio, em Setúbal, dos 12 aos 14 anos. Parecia um menino impecável, mas ultimamente dizem que se desorientou e meteu em negócios que correram mal...
O 2º, aos 18, foi um trapaceiro chamado António Luís, muito mais velho, advogado, já na casa dos 30, a quem o Manel Queiroz deu um sopapo, em defesa da prima.
Do 3º gostou - estava no 3º ano da Medicina, José António Xavier Gouveia, de Abrantes, Vila de Rei.
Acabou com o namoro para casar com uma "prometida" de Vila do Rei, coisa de famílias...
O 4º Carlos Manuel Henriques de Noronha deu casamento, durante 20 anos.
John Hobbs, na África do sul. Era economista, engº e psicólogo, com um alto cargo no governo. Durou quase dois anos. Era um homem educadíssimo, com sentido de humor, encantador.
A partir daí, nada de namorados.

Maria Manuela Aguiar disse...

Falta um, o mais louco de todos, o Zé Luís, que tentou sequestra-la em Águeda, e a ameaçava de pistola, se tentasse fugir. Fomos lá buscá-la num dia em que ele estava para África, mas houve que afrontar a família inteira, que estava no "complot"...
A quinta era ao pé do rio, grande e fechada...
Não sabe como saíu de lá, mas eu lembro-me de participar na operação de resgate. Fomos de carro, com o Tio Zé e a minha mãe, guiadas por indicação dada por carta. Seria alguma criada, que ajudou? Andamos por "seca e meca", para dar com a quinta, mas conseguimos.
O Tio Zé queria bater-lhe, mas ele estava longe.
Tenho uma ideia vaga dos pormenores, do stress, da incerteza, do encontro com a Xana, finalmente em liberdade. Sem nada na mão... A primeira de algumas vezes em que isso aconteceu.

Maria Manuela Aguiar disse...

A Xana conheceu-o em Luanda. Era economista, com um posto importante no Instituto de Pesca. O namoro começou lá. Ele tornou-se obsessivo. ameaçava dar-lhe um tiro se o deixasse.
Veio de Luanda para Águeda, com a irmã dele, a pretexto de tratar dos papéis para o casamento. A Àgueda a fomos buscar. no tal dia já nebuloso, de quem ningúem se recorda distintamente!

Maria Manuela Aguiar disse...

Felizmente, ele encontrou outra e casou, deixando a Xana em paz. Teve dus filhas: uma chama-se Mº Alexandra, outra Mª Eduarda.
Não é pura coincidência, não!

Maria Manuela Aguiar disse...

Hoje fala-se de sinais - a Xana teve em criança uma doença, que se pensou ser tinha. Não era, não cedeu à medicação. Usava umas touquinhas graciosas. Fizeram-lhe rios "X", em doses enormes. Queimou o cabelo, que nunca mais voltou a ser o que era. E, agora, nascem-lhe quistos, que tem de eliminar...
A conversa começou com o problema da minha mãe, que arranhou um sinal e tem amanhã consulta marcada na DRª Elvira - graças`ao Sr. Pires, claro!
Coisas do nosso quotidiano.

Anónimo disse...

Xana disse...
Foi através da enfermeira que fazia tratamentos à Mariazinha Braga, que a Dona Eugénia Mello me convidou para "dama de companhia". Ela estava já com a doença de Parkinson, que não lhe afectava a cabeça, nem o caracter. Era encantadora.
Com ela vivi tempos fantásticos - sempre em festas, em leilões, em passeios.
Um dia resolveu vender, em leilão, às escondidas, uma cabeça de javali, avaliada em 3.000 contos. Foi comprada pelo cunhado. Dei, mais tarde com ela, a cabeça, na Quinta dos Perdidos...
Muitas vezes, vendia coisas valiosíssimas, que tinha em arrecadação. Gostava de dar dinheiro aos padres, de comprar vestidos caros - sem depender dos filhos...

Anónimo disse...

Xana disse
Gostava também muito de comprar livros, de edições raras.
Os filhos não queriam saber da literatura para nada...

Anónimo disse...

Xana disse
A Dona Eugénia era filha do Prof Doutor Pedro Cunha, Marquês de Olhão. Ainda o conheci, já acamado, com uns olhinhos muito vivos, a perguntar quem eu era.
Um dia fui eu quue lhe salvei a vida. Todos os dias um dos filhos ia fazer-lhe companhia. Esse era o dia da Dona Eugénia. Percebi que ele quase não respirava. Falei ao Fernando, que me mandou chamar uma ambulância para o levar para uma urgência. Mas as portas do palácio de Xabregas, naquela ala, eram estreitas demais para a maca. Não exitei! Mandei deitar a porta abaixo.
E assim o salvei. Durou mais dois meses.

Anónimo disse...

Xana disse...
Outro episódio cómico foi uma reportagem do Prof Hermano da Silva sobre o Palácio de Xabregas, que vem do tempo do Tristão da Cunha, um antepassado da Dona Eugénia (uma das alas - outras são posteriores ao terramoto).
A certa altura, a mostrar um dos quartos da ala nova, o Prof. Saraiva
resolveu dizer que ali tinha dormido Tristão da Silva.
A Dona Eugénia disse-lhe depois: "Está enganado, tem de refazer o programa. Aqui nunca esteve Tristão - esta parte do palácio é recente".
Resposta dele: "Não tem importância! Assim é mais interessante para o público".

Anónimo disse...

Xana disse...
Muitas vezes a levei a Fátima. E às missas. Às vezes 3 por dia!
Nos funerais das marquesas velhas, que passavam o tempo a morrer, uma atrás de outra, ou pela intenção de salvar as doentes, ou por alma deste e daquele...

Anónimo disse...

Xana disse...
Era muito devota!
Quando íamos de viagem, de início ficavamos no mesmo quarto de duas camas. Mas como ela ficava até altas horas a ler as pagelas dos santinhos, acabei por lhe dizer que tinhamos de ficar em quartos separados, com uma porta de comunicação - para poder dormir...
E assim aconteceu daí em diante.

Anónimo disse...

Xana disse...
A outra, a Mariazinha Braga, estava no polo oposto.Tinha dois amantes, um de dia, um ex-ministro de Salazar, qualquer coisa Saraiva, outro de noite, o Dr. Mário Quina, pai dos velejadores.
Sempre que me encontrava, ainda que fosse no mesmo dia, cumprimentava, estendia a mão e dizia: "como está?"
Já estava na casa dos 90 e ela na dos 70...
A fortuna da Braga vinha do pai, que construiu boa parte do Estoril à semelhança de Biarritz.

Anónimo disse...

Xana disse...
Também ajudei a salvar a vida do dr. Quina, quando lhe deu um ataque em pleno quarto da Mariazinha.
Ela fugiu espavorida e deixou-me só com o moribundo. Falei ao Fernando, que me aconselhou a falar para o filho, que também era médico. Mas ele estava num cruzeiro do mediterâneo - em qualquer caso, mandaram um especialista, que o levou para o hospital e o recuperou, para durar quase até aos 100 anos.
Mas antes de chegar a salvação, estava eu a tomar-lhe o pulso, e ele, com a sabedoria de médico, dizia:
"não é aí, é mais abaixo". Pálido, desfalecido, mas lúcido!

Maria Manuela Aguiar disse...

Apelido do noivo de Águeda: Miranda

Maria Manuela Aguiar disse...

De casa da Braga a Xana despediu-se ao fim de pouco tempo. Parece que pior do que a própria anciã,completamente exótica, eram os filhos. Uma das filhas um dia foi tão arrogante que a Xana teve de a calar, dizendo-lhe que o que a diferenciada dela era menos dinheiro e mais maneiras...

Anónimo disse...

XANA disse...

A BRAGA todos os dias tinha de fazer uma caminhada de 1 hora e cinco minutos - minutos certos. Ia de bengala, chapéu tirolês, saia e casaco Yarrell, óculos escuros e sapatos de salto alto.
Eu seguia no carro, atrás, penosamente, até que soava o minuto de a trazer de volta para o alto do Monte Estoril.

Anónimo disse...

Xana disse...
A filha da Mariazinha, a Fafá ofereceu-me um lindo casaco Yarrell, uma marca alemã, que vendiam na loja delas. Um dia, convidou-me para almoçar em casa dela, com o Dom Henrique de Bragança. No fim, ele agarrou-me as pontas do casaco, enquanto me dizia:
"É um casaco muito bonito".

Anónimo disse...

XANA disse...
Já com a Dona Eugénia, fui aos Açores, ao casamento do actual Marques de Olhão, na Ilha Terceira. Foi uma grande festa de família. A noiva era Bettencourt, como toda a gente.
Daí fomos as duas para São Miguel.
Ela era muito educada, mas muito teimosa. Como tinha "Parkinson", devia andar, com cuidado. Nesse dia,
quis ir visitar a catedral. Eu queria que fossemos a pé, ela queria ir de carro. Bem lhe disse que não havia estacionamento, podiam rebocar o carro. Venceu a dela... Eu fiquei no carro, à espera. Ela subiu com uma ligeireza nunca vista, e, duas horas (duas!) depois desceu, com a mesma agilidade!
A comentar: "Não sabe
o que perdeu! Vi uma exposição lindíssima de paramentos".
Nesse dia não dei nem mais uma palavra...
No dia seguinte, ela pediu-me desculpa e foi comprar uns sapatos
para me oferecer.

Anónimo disse...

Xana disse...
Uma vez resolveu dar um cocktail, reunindo todos os ex-ministros de Salazar. Foi uma busca completa. Vieram imensos. Muitos tão caquéticos, que eu tinha de os ajudar a entrar em casa, devagarinho. Veio também a filha do Tomás, a sobrevivente, que era a mais bonita. Essa partiu uma das chávenas de um precioso serviço da Vista Alegre. Um susto!

Anónimo disse...

XANA disse...
A Dona Eugénia e a irmã tinha dois serviços iguais, da Vista Alegre,e, em festas com muita gente, emprestavam uma à outra o que fosse necessário.,
Havia uma diferença - o da irmã era numerado, muito mais raro.
Quando a Tomás partiu a chávena, eu fui logo ver o fundo, muito disfarçadamente... Não era uma das numeradas! Um alívio.
A irmã teria ficado furiosa.

Anónimo disse...

Xana disse...

Ministros velho, relhos.
Foi em 1996 - já devem estar todos mortos.
Estiveram umas três horas. Não aconteceu nada de especial. Alguns já quase não falavam...
Mas a idéia foi boa. Nunca pensei conhecer pessoalmente aquelas caras. E menos ainda dar-lhes o braço para os ajudar a entrar em casa!

Anónimo disse...

Xana disse...
Até vim numa revista, com a Dona Eugénia, a entrar para outro famoso evento: a tourada em honra de Dom Duarte antes do casamento. Enganaram-se no meu nome - chamaram-me Armanda...
Estavamos num camarote com a família Cunha (do Dom Pedro da Cunha, o pai da Dona eugénia, nessa data ainda vivo).

Anónimo disse...

Xana disse...
No ano em que as 3 filhas da Dona Eugénio fizeram uma 30, uma 40, outra 50, deram uma festa numa das suas casa, um palacete no Estoril. Com gente de todo o mundo! Eram 300pessoas - devia ser a alta finança europeia toda.
A Dona Eugénia não foi, porque estava presente o marido com o então "caso" e actual mulher (a Pilar, a quem chamavam "Pilita" - mas que se irritava muito quando lhe chamavam a "Pilita do Jorge"). No entanto, a Dona Eugénia insistiu muito para que eu fosse. E eu fui sozinha. De vestido vermelho comprido (o que a Zé levou ao casamento do João Miguel). Por cima, um casaco de raposa "argentée", que era da Docas. Quando eu cheguei, uma das filhas Mello, a Marta, disse-me: "Mas que chique, Maria Alexandra!"
Não havia jornalistas nem fotógrafos... Proibidos!
Mas houve um comentário numa revista "social". Criticaram os vestidos das senhoras, porque eram todos pretos. Elogiaram as excepções: uma de vestido vermelho, outra de beige.
A de vermelho era eu - não havia mais nenhuma.

Anónimo disse...

Xana disse...
Com o José Manuel de Melo também há muitas histórias.
Fui trabalhar com ele, depois de ter estado em convalescença 18 meses. Nessa altura, a minha substituta junto da Dona Eugénia, não saiu para eu voltar. Os filhos preferiam que fosse ela , porque lhes dava conta de tudo o que ela gastava. Por ex. os cocktails, que custavam perto de mil contos . 3 dias antes, começavam os preparativos... Eram sempre de estrondo!
Eu nunca a denunciei!

Anónimo disse...

Xana disse...
Ainda sobre a Dona Eugénia.
Andava sempre de sapatos fechados, meia de vidro, mesmo no calor do verão, e de luvas - havia-as de todas as cores.
Um dia esqueceu-se das luvas. Eu queria ir atrás buscá-las, mas ela teimou em chamar a criada.
Acho que fazia isso para marcar a diferença do meu estatuto, que a criadagem tinha dificuldade em aceitar..
Daí a pouco, aparece a Antonieta com as luvas na mão para entrgar à senhora.
A Dona Eugénia:
"Parece impossível, que estejas há 40 anos e ainda não saibas como deves trazer as luvas: numa bandeja de prata!
E ela teve de voltar e de lhas dar na bandeja de parata, como deve ser...

Anónimo disse...

Xana disse...
Não só a criadagem aceitava mal o meu estatuto, algumas maequesas também. Lembro-me de ouvir o meu nome quando alguém telefonava a D. E - ouvi o meu nome e parei...
Era uma das tais marquesas, que não queria incluir-me na lista do casamento, a acompanhar a Dona E.
E a D. Eug. respondia: "Ela é como nós! A Maria Alexandra é igual a nós!"
E eu lá fui ao casamento. Nem me recordo quem era.

Anónimo disse...

Nos "Perditos", com J.M. de Mello, tinha 6 criadas sob as minhas ordens (só as de dentro!).
Às vezes, tinhamos 60 hóspedes, durante dias!
Nunca nada correu mal.
Ao fim de 2 anos, quando me despedi para ir para Tânger, ele disse-me: "Mªa Alexandra, quero-lhe comunicar que apreciamos muito a sua colaboração dentro desta casa".
Ganhava 250 contos, uma casa giríssima, com ar condicionado, dentro da herdade. Tinha carro, combustível - despesas zero!
Na altura das caçadas, era a 1ª a levantar-me, a última a deitar-me. Supervisionava tudo. O resto da semana, e nos outros meses, de Fevereiro a Setembro, era uma tranquilidade. No verão, as temperaturas chegavam aos 50º - não aprecia ninguém... Eu ficava no meu ar condicionado, a fazer tapetes de Arraiolos. Tirava férias em Setembro. Convidava amigos - podia receber quem quisesse. Recebi a Docas, o Nestó ficou de ir mas não foi.
Era uma herdade linda, com rio, lagos artificiais, montes, javalis, veados perdizes...
A caça era às perdizes. Ele não deixava tocar nos veados. Eles vinham até perto de mim, comer milho, ao pôr -do -sol.

Anónimo disse...

Xana disse...
àmanhã vou contar a história da "voz das profundezas do inferno", passada com José Manuel de Mello, que era muito "bruto" - embora muito boa pessoa, humanamente falando... - ao contrário do irmão, Jorge, o marido da Dona Eugénia, que era um verdadeiro "gentleman".

Anónimo disse...

Xana disse...

O homem trabalha,
O Homem verga,
O Homem quebra,
Mas não morre.

O Homem chora
O homem grita
O homem ----
E ninguém o socorre.

Qualquer coisa do género.
É um poema dos meus 20 anos, quando estava na Trefilaria. Tinha um amigo comunista, que o mandou publicar no AVANTE. Anónimo, é claro, porque não queria o destino do meu amigo, que estava sempre preso-

Anónimo disse...

Xana disse...
JM Mello mandou-me chamar para me dizer que tinha recebido uma chamada para mim, mas que "a voz parecia saída das profundezas do inferno".
Estou a ver a cena, ele sentado, a almoçar (lá só almoçava o chauffer!), com ar de quem quer provocar.
Irritada respondi: "Devia ser a minha mãe, Sr. Mello". Bem o queria fazer-se sentir mal, mas não resultou.
Passado algum tempo, tocou o telefone. Atendi eu. Era a Senhora Dona Mª Eugénia. Conversamos um bom bocado. E fez-se luz no meu espírito - a voz a que ele se referia era mesmo ela, com a sua doença de Parkinson.
Voltei à sala da jantar, onde ele continuava a almoçar, e dei-lhe a novidade: "Já sei de quem era a voz. Era a sua cunhada".
"Cunhada? Qual Cunhada?"
"A Srª Dona Mª Eugénia".
E ele:
"Oh, Diabo! Oh diabo!".
Senti-me vingada...

Anónimo disse...

Xana disse...

O motorista, Sr. Pina, confidenciou-me, uma vez em que eu estava danada, que o J M de Mello gostava de quem lhe desse luta e ali nos Perditos, eu era a única que lhe fazia frente. "Mas ele gosta muito da senhora!"

Anónimo disse...

Xana disse..
Ele tinha duas cadela (Labrador), a Dona Maria e a Bona Branca. E ai de quem se esquecesse do "dona"!
Andava eu a passear a Lira, que estava de visita com a Docas - de trela, é claro - e ele passou no seu jeep, com as "donas".
À hora do almoço mandou-me chamar e comunicou-me:
"Se alguma coisa acontecer às minhas cadelas, pode ter a certeza absoluta de que lhe dou um tiro!".
Nunca cheguei à conclusão se o tiro era para a Lira ou para mim.
Nem respondi!
Resolvi despedir-me e comecei a fazer as malas, incitada pela Docas.
Telefonei à Cristina - a filha - a participar a decisão e ela disse-me que nem pensasse em tal, que o pai adorava cães e nunca faria mal a nenhum. Lá lhe telefonou e entrou imediatamente em contacto comigo:
"O pai só ria: "OH! HO! HO"!
Fui desfazer as malas.

Anónimo disse...

ana disse...

Só confiava as "Donas" a mim ou ao chauffer. Quando estava ausente, telefonava-me a perguntar: "Como estão as minhas meninas?"
E eu lá respondia que estavam bem, mas cheia de sossego."

Anónimo disse...

Xana disse...
Numa das caçadas, mandei as criadas fazer pataniscas - como deve ser, com o bacalhau bem esfiado. Vigiei tudo, muito atentamente. Guardava registo do que era servido, para não haver repetições.
Lá foram quantidades enormes de pataniscas para os caçadores.
À noite, quando esperava um elogio - embora ele nunca desse elogios a ninguém, pelo que o não se pronunciar era sinal de que estavam as coisas óptimas... - disse-me severamente que não gostava de pataniscas frias e que as queria quentes.
Impossível, naquela quantidade, respondi. E assim acabaram as pataniscas nos grandes ajuntamentos. Só em casa, à mesa!

Anónimo disse...

Alexandra Aguiar da Fonseca disse...


Lembrando o Tio Zé:
Só uma vez ele se zangou connosco. Estava eu em casa da Tia Clarinha e do Tio Manuel, a passar duas semanas, na Rua Fernão de Magalhães. O Tio Zé estava também por cá, vindo das Américas e resolveu convidar-nos para irmos com ele a Espinho, ao casino.
Três miudas de 15 anos... A Nini, a Manela Clara e eu.
Como o Tio Manuel não deixaria, se soubesse, esperamos que adormecesse, saímos descalças e a Tia Clara atirou-nos os sapatos pela janela...
De seguida, fomos no carro, a cair de velho, do Tio Zé a Gondomar, para ele mudar de fato - para um mais solene. E, na volta, trazíamos o Zé, irmão da Meira - um homem lindo, de cortar a respiração!

Xana Aguiar da Fonseca disse...

O Tio Zé parou a carripana em frente da Villa Maria e deixou o motor a trabalhar, com receio de que, depois, não pegasse...recomendou que não mexessemos no carro... Mas eu, mal ele virou costas, resolvi ir dar uma volta ao Souto, mas não consegui passa da 1ª À 2ª... e no Souto, como não quis passar devagarinho. à vista de muita gente, acelerei em 1ª. O carro roncava como se fosse um avião...
Parei no mesmo sítio, mas, pouco depois, o motor foi-se abaixo!
Quando ele veio, desconfiou de interferência nossa e ficou furioso, tanto mais quanto não foi capaz de o ligar, de novo!
Obrigou-nos a correr atrás dele, de salto alto, até Quintã - a casa do Zé. Já nem queria ir a Espinho, mas o lindíssimo Zé convenceu-o. Lá fomos, no normalíssimo carro deste último!

Xana Aguiar da Fonseca disse...

No casino, o espectáculo era para maiores de 21 anos- um show de "strip", que começava à meia noite.
A essa hora, apagaram-se as luzes e, depois, quando se acenderam o holofote vermelho, vimos uma criatura envolta em plumas! Eu tive um ataque de riso incontrolável. Saí a correr, para a casa de banho, onde continuei à gargalhada. Creio que se ouvia à distância. Veio o Tio Zé, furiosíssimo, e levou-nos, logo, de volta para o Porto, jurando nunca mais nos convidar para coisa alguma... Ninguém viu o strip...

Anónimo disse...

Lólita disse...
Eu costumava ir com o Eduardo para essa "boite", qundo estavamos em Espinho.
O Eduardo e eu dançavamos, dançavamos...

Anónimo disse...

Docas disse
Quando, ao fim de muitas décadas, resolvemos fazer uma romagem à Freixeda, os nativos reconheceram o Nestó e a Xana e fizeram-lhe uma grande festa. Eles estavam na memória da aldeia. Eu não.
Ninguém se lembrava de mim!
Os meus irmãos eram brancos, de grandes olhos verdes, cheios de "glamour"... Eu era igual a eles, morena, cabelo liso e escuro, não dava nas vistas.

Anónimo disse...

Noutro aspecto era a Xana muito mais próxima deles, andava descalça, misturava-se com as crianças da aldeia, tal como elas mamava das tetas das cabras, ia para o galinheiro esperar que as galinhas pusessem o ovo, fazia um furinho e sorvia clara e gema.
Um horror!

Xana Aguiar da Fonseca disse...

AGORA A EMIGRAÇÃO

A primeira experiência foi em Angola - Luanda.
Não me dava com o clima. Foi sempre emigração temporária. Nunca mais de 3 meses... Por várias vezes.
De princípio, de navio. Na 1ª classe do Infante Dom Henrique.
Foi glorioso, Quem me dera outra viagem num paquete assim. O mar de um azul profundo! A paz!Para quem não enjoar, que era o meu caso.
Bailes! Desporto! Concorri com homens num torneio de ping-pong. Como era a única mulher, embora não jogasse nada, ganhei o 1º prémio feminino.
Sempre actividades, cada noite com o seu programa. A festa da passagem doo Equador.
E havia manadas de peixes voadores...

Xana Aguiar da Fonseca disse...

A Manela tinha-me recomendado que procurasse uma amiga do tempo do colégio, a Marilú. Maria de Lourdes Corte Real.
Quando vi a dimensão da cidade, desisti da procurar.
Mas no meu 1º emprego, em que ia substituir uma grávida, logo que me sentei, olhei para o "plackard" com o seu nome: Maria de Lourdes Corte Real!

Xana Aguiar da Fonseca disse...

Fui visita-la, é claro!
Ela estava sem ninguém - sem fortuna, sem amigos.
Levava-lhe sopa e outras coisas mais. Tornamo-nos amigas.
Nasceu depois um menino loiro de olhos azuis, filho do marido Corte Real, embora ela dissesse que não, para guardar a custódia da criança.
Anos depois teve uma menina linda, a quem chamavam Missanga.
Ela era a descendente da raínha Ginga- tinha nisso um grande orgulho e preferia a convivência dos negros à dos brancos.
Mas os filhos eram de brancos!

Xana Aguiar da Fonseca disse...

Em casa dela conhecemos o Fernando,que era médico assistente e amigo.
Ela não podia levantar-se para não perder o bébé.

Xana Aguiar da Fonseca disse...

Também na casa dela conhecemos um tio, que era o Carlos Ferreira, grande pintor angolano, que pintou o famoso quadro da Docas, de vestido verde.

Xana Aguiar da Fonseca disse...

Segundo esse tio, ela não era nada descendente da raínha guerreira. O pai dela, que tinha muito dinheiro, inventou o parentesco e organizou a festa da sua coroação...

Xana Aguiar da Fonseca disse...

Fomos um dia, com um alferes pequenino, amigo do alferes Moreira, visitar uma fazenda em zona de risco, onde nunca tinha havido nada. Gente conhecida dele.
Eu passei o tempo em pânico. Sentia-me insegura. Comecei logo a pedir ao pai para virmos embora! Fivou irritadíssimo. Estava divertido e queria aceitar o convite deles, para o jantar. Voltaríamos no dia seguinte.
Foi um medo providencial. Precisamente nessa noite a fazenda foi assaltada. Mataram a família a tiro, um a um, e os animais também. Só se salvou um bébé, que estava a dormir e o pai, ferido, mas não mortalmente,
A fazenda era um paraíso. Ía até ao mar, com uma fiada de palmeiras, onde tiramos fotografias...

Xana Aguiar da Fonseca disse...

Lolita disse...
Fiz muitas viagens também.
O eduardo chamava-me para lá.o Gustava escrevia muitas cartas, a pedir o meu regresso.
Para lá, o Eduardo pagava a passagem. Para cá, pagava o Gustavo...
Era um vaivém...

Anónimo disse...

Lolita disse...
O Eduardo convivia muito com pretos. E levava-me. Tratavam-me bem, sim páticos, hospitaleiros. Gostavam muito de mim.
Vinho da metrópole, tudo de bom!

Xana Aguiar da Fonseca disse...

A fazenda ficava entre o rio Libombo e o rio Fifune.
Não me lembro do nome. Talvez esteja escrito numa das fotos.

Xana Aguiar da Fonseca disse...

Em Angola estive quantas vezes? Três? Quatro?
Era como os pastores alemães, que por lá morriam, em guerra com o clima...

Xana Aguiar da Fonseca disse...

Segunda emigração, também curta.
O projecto era o Carlos Manuel arranjar um bom emprego. O Herique de Almeida dizia que era facílimo. Não foi. A Docas deixou o pequeno apartamento em que vivia e arrendou um maior.
No dia em que aterrei em Charles de Gaulle, estava a Docas à espera e a dizer-me que o Carlos manuel tinha acabado de partir para Joanesburgo...
Fiquei em turismo, a visitar museus.
Resolvi ir também para a RAS...

Xana Aguiar da Fonseca disse...

Diziam que a RAS era perigosa, mas o maior susto foi para JNB, rebentou uma bomba junto ao balcão da TAP, no aeroporto...

Anónimo disse...

Lolita disse...

Perogosa era Luanda.
O funcionário da PIDE, que conheci a bordo do paquete, mandou-me chamar e recomendou-me que mandasse as filhas, imediatamente, para a metrópole...
Elas insistiram em ficar e quem veio embora - não por causa da guerra - fui eu!

Xana Aguiar da Fonseca disse...

Quando cheguei a JNB, ele tinha alugado um quarto num hotel em Hillbrow - um zona péssima. Ouvi tiroteio toda a noite. E ele que me tinha escrito para Paris a perguntar se queria casa com piscina numa zona menos boa ou sem piscina, numa área segura...

Xana Aguiar da Fonseca disse...

A seguir vivemos em sítios melhores - finalmente num condomínio em Bedfordview, com piscina e court de tenis.
Quando nos separamos, o Carlos esfaqueou as roupas da casa e a minha metade do colchão... Simbólico!
Falei à Eulália, minha advogada e ela apareceu, de imediato.
Com ela veio com o sr. Castro, de pistola em punho - correndo a casa toda para ver se não havia embuscados. Que cena!
Era bem simpático, o Sr. Castro - ela não... Uma oportunista.

Xana Aguiar da Fonseca disse...

Insistiu que fosse para cas dela, por algum tempo. Depois, quis cobrar-me honorários de 24 horas por dia, por todos os dias que lá passei.
A Docas fez uma queixa à Ordem dos Advogados e ela desapareceu de cena...

Anónimo disse...

Lolita disse...
Fiz duas vezes à Africa do Sul, de visita. Estive lá no ano de 1990 e em 1991, em duas casa diferentes. Ambas muito boas, como são sempre as casa da Xana.

Xana Aguiar da Fonseca disse...

Uma vez perdi-me, à volta de Pretória, e entrei numa township. Terra batida, o carro levantava nuvens de pó. Pretos por todos os lados, olhando-me espantados. Andei mais de duas horas, tinha muita gasolina. Até que vi 2 polícias pretos. Nem conseguia falar. Chorava. Eles acalmaram-me e vieram comigo, até sair do malfadaddo labirinto!
Turista que se perdia por ali, era turista morto...

Xana Aguiar da Fonseca disse...

Ía muitas vezes a SANDTON, ao hotel do centro comercial. Sentava-me num café e tomava uma bebida, tranquilamente...

Xana Aguiar da Fonseca disse...

Maria Manuela Aguiar disse...

Era precisamente nesse hotel, onde eu costumava ficar, quando de visita à RAS!

Xana Aguiar da Fonseca disse...

Em JNB vi um dia um negro ser baleado. Estupidamente parei. Ele estava a morrer. Fora assaltado para lhe roubarem um rádio!!!
Estava eu cá fora, junto ao moribundo, quando chega a polícia (brancos).
Fartaram-se de me ralhar:
"Nunca mais faça isso! O assaltante podia ter disparado contra si!"
E eu dizia: "Mas ele estava a morrer!"

Mataram o assaltante nessa noite.Em casa dos amigos, onde estava a jantar, ouvi os tiros.